quinta-feira, 8 de outubro de 2020

O REGRESSO DE ‘COLOMBO’ DIVULGADO NOS REINOS EUROPEUS E NOS ESTADOS ITALIANOS

 

O REGRESSO DE ‘COLOMBO’ DIVULGADO NOS REINOS EUROPEUS E NOS ESTADOS ITALIANOS

 

O elucidativo silêncio da nação genovesa

 

Por: Carlos Calado[1]

 

A 4 de Março de 1493 chegava a Lisboa, no regresso da sua primeira viagem de descoberta de novos mundos e povos desconhecidos, a caravela Niña capitaneada pelo Almirante Christóval Colon. Para além da tripulação, trazia consigo alguns indígenas que tinha tomado nas ilhas que alcançara na sua viagem.

Esse momento histórico da chegada ficou registado no Diário de bordo[2] que o Almirante prometera aos Reis Católicos antes da partida em Agosto do ano anterior:

 

«Lunes, 4 de marzo

…Venido el día, conoció la tierra, que era la Roca de Sintra, que es junto con el río de Lisboa, adonde determinó entrar, porque no podía hacer otra cosa: tan terrible era la tormenta que hacía en la villa de Cascaes, que es a la entrada del río. Los del pueblo dice que estuvieron toda aquella mañana haciendo plegarias por ellos, y, después que estuvo dentro, venía la gente a verlos por maravilla de cómo habían escapado; y así, a hora de tercia, vino a pasar a Rastelo dentro del río de Lisboa,…»

 

«Segunda Feira, 4 de Março

… Ao romper do dia reconheceu a terra, que era a Roca de Sintra, que está junto ao rio de Lisboa, onde decidiu entrar, porque não podia fazer outra coisa: tão terrível era a tormenta que fazia na vila de Cascais, que fica na entrada do rio. Disse que os da povoação estiveram toda a manhã a rezar preces por eles e, depois de entrar, vinha a gente para vê-los, pela maravilha de terem escapado; e assim, pela hora das terças foi até ao Restelo, dentro do rio de Lisboa …» [3]

 

Desde Lisboa foi enviada uma carta, ou duas cartas idênticas, do Almirante para os altos funcionários dos Reis Católicos, Luis de Santangel e Gabriel Sanchez. Nessas cartas descrevia-se o essencial de toda a viagem até ao dia 15 de Fevereiro, ‘sobre as ilhas de Canária’ conforme o final das cartas. Na verdade, segundo os registos no Diário, nesse dia 15 Colon encontrava-se nos Açores…

Já em Lisboa o Almirante juntou-lhe uma adenda explicando que, quando já estava no ‘mar de Castela’, uma tempestade o arrastara para Lisboa. Na verdade, segundo os registos no Diário, já estava perto de Lisboa quando a tempestade se terá dado. E não estivera no mar de Castela como escreveu:

 

Data: 15 Fevereiro - 14 Março 1493 [4]

Remetente: O ALMIRANTE

De: Lisboa

Destinatário(s): Luis de Santangel / Gabriel Sanchez [5]

Em: Castela e Aragão

 

«Señor, porque sé que avréis plazer de la gran vitoria que Nuestro Señor me ha dado en mi viaje, vos escrivo esta, por la qual sabréys como en .XXXIII. días pasé de las islas de Canaria á las Indias con la armada que los ilustrísimos rey é reyna nuestros señores me dieron, donde yo fallé muy muchas islas pobladas con gente sin número; y d'ellas todas he tomado posesión por Sus Altezas con pregón y vandera real estendida, y no me fué contradicho. …

… adonde toda la christiandad deve tomar alegría y fazer grandes fiestas, y dar gracias solemnes á la Sancta Trinidad … en tornándose tantos pueblos á nuestra sancta fe, y después por los bienes tenporales ; que no solamente la España, mas todos los christianos ternán aquí refrigerio y ganancia. …

… Esto, según el fecho, así en breve.

Fecha en la caravela, sobre las yslas de Canaria, á .xv. de febrero, año mil .cccclxxxxiii.

Farà lo que mandaréys

El almirante.»

«anima que venia dentro en la carta»

«Después d' esta escripto, y estando en mar de Castilla, salió tanto viento conmigo sul y sueste, que me ha fecho descargar los navios, pero corrí aqui en este puerto de Lisbona oy, que fué la mayor maravilla del mundo, adonde acordé escrivir á Sus Altezas, en todas las Yndias he siempre hallado los temporales como en mayo; adonde yo fuy en .XXXIII. días, y volví en .XXVIII., salvo qu' estas tormentas me an detenido .XIIII. días corriendo por esta mar. dizen aquá todos los hombres de la mar que jamás ovo tan mal yvierno ni tantas pérdidas de naves.

Fecha á .iiii. días de marzo.»[6]

 

«Senhor, porque sei que tereis prazer na grande vitória que Nosso Senhor me deu na minha viagem, vos escrevo esta, pela qual sabereis que em 33 dias passei das ilhas das Canárias às Índias com a armada que os ilustríssimos rei e rainha nossos senhores me deram, onde eu achei muitas ilhas povoadas por inúmera gente; e de todas elas tomei posse com pregão e bandeira real estendida, e não me foi contrariado…

… onde toda a cristandade deve alegrar-se e fazer grandes festas, e dar graças solenes à Santa Trindade com muitas orações … por se converterem tantos povos à nossa santa fé e depois pelos bens temporais; que não apenas Espanha mas todos os cristãos tenham aqui refrigério e lucro …

Isto, conforme os factos, assim resumido.

Feita na caravela, sobre as ilhas das Canárias, a 15 de Fevereiro do ano de 1493

Fará o que mandáreis

O Almirante»

«Adenda que vinha dentro da carta»

«Depois desta escrita, e estando no mar de Castela, levantou-se tanto vento sul e sueste que me fez descarregar os navios, mas corri para este porto de Lisboa hoje, que foi a maior maravilha do mundo, de onde decidi escrever a Vossas Altezas. Em todas as Índias encontrei sempre os tempoarais como os de Maio; onde eu fui em 23 dias e regressei em 28, salvo que estas tormentas me detiveram 13 dias correndo por este mar. Dizem aqui todos os homens do mar que jamais ouve tal inverno nem tantas perdas de navios.

Feita a 4 dias de Março» [7]

 



Imagem 1: data no final da adenda à carta a Santangel [8]

 

Esta carta enviada aos altos funcionários reais deu origem não só a um enorme entusiasmo curioso entre os dignatários da velha Europa como também à maior acção propagandística de que há memória naquelas épocas.[9]

Foi imediatamente impressa em Barcelona, tanto em castelhano como em catalão, traduzida para latim e outros idiomas, impressa em vários países e difundida um pouco por toda a Europa.

Esta propaganda atingia um duplo objectivo: começou por servir a Cristóvão Colon que via reconhecidos os seus direitos a títulos, altos cargos e rendimentos de grande valor potencial e servia os Reis Católicos no seu desejo de receber a bênção papal para colonizar aquelas terras e cristianizar os seus povos.

A versão castelhana do relato foi também parcialmente reproduzida em Sevilha. Roma foi o grande centro difusor pela Europa. Ali se publicaram nove edições em latim ainda no ano 1493 e mais uma no ano seguinte.

 

À tradução para latim da autoria de Aliander de Cosco publicada em Roma por Stephanus Planck em 29 de Abril de 1493 [10], não faltaram algumas imprecisões. Mas o mais influente e nefasto contributo para estabelecer a confusão que tem perdurado por cinco séculos foi dado pelo Bispo de Montepeloso, R.L. Corbaria, no epigrama laudatório aposto no final da tradução. O nome do descobridor, que já fora escrito Colom na edição de Barcelona por Pedro Posa, foi impropriamente transformado em Columbo:

 

«Epistola Christofori Colom, cui etas nostra multum debet, de insulis Indie supra Gangem nuper inventis, ad quas perquirendas, octavo antea mense, auspiciis et ere invictissimi Fernandi Hispaniarum regis missus fuerat, ad magnificimi dominum Raphaelem Sanxis, eiusdem serenissimi regis tesaurarium, missa, quam nobilis ac litteratus vir Aliander de Cosco ab hispano idiomate in latinum convertit. tertio kalendas maii .MCCCCLXXXXIII. pontificatus Alexandri sexti anno primo.

(…)

Hec, ut gesta sunt, sic breviter enarrata, vale.

Ulisbone, pridie idus martii.[11]

Christoforus Colom, oceanee classis prefectus.»

 

«Epigramma R.L. de Corbaria, episcopi Montispalusii, ad invictissimum regem Hispaniarum.

 

IAM nulla hispanis tellus addenda triumphis, atque parum tantis viribus orbis erat, nunc longe eois regio deprensa sub undis auctura est titulos, Betice magne, tuos. unde repertori merito referenda Columbo gratia, sed summo est maior habenda Deo, qui vincenda parat nova regna tibique sibique, teque simul fortem prestat et esse pium.»

 

 

«Carta de Cristóbal Colom, a quem é muito devedora a nossa época, pelas ilhas da Índia, achadas há pouco sobre o Ganges, e a cuja conquista tinha sido enviado fez oito meses, a expensas dos invictíssimos Reis das Espanhas, Fernando e Isabel; dirigida ao magnífico Sr. Rafael Sanchez, tesoureiro dos mesmos sereníssimos monarcas e traduzida do espanhol para latim pelo generoso e literato Leandro de Cozco em 29 de Abril de 1493, primeiro ano do Pontificado de Alexandre VI.

(…)

Tais são os acontecimentos que descrevi resumidamente. A Deus.

Em Lisboa a catorze de Março

Cristóbal Colom, Almirante da Armada do Oceano.»

 

«Epigrama de R.L. de Corbaria, Bispo de Montepeloso, ao Invictíssimo rei das Espanhas

Já não resta a Espanha terra alguma onde o seu esclarecido estandarte não ondule e triunfe (…)

Ao imortal Columbo louvor eterno e recordação de um povo agradecido. (…)» [12]

 

A estas publicações da carta em Roma (10 edições) seguiram-se várias outras reproduções, em Florença e Pavia (2) na península itálica, Paris (3), Antuérpia, Leipzig e Basileia (3). A partir desta última cidade deu-se a propagação no Sacro Império, para Strasburgo, Nuremberga, Augsburgo e Reutlingen (2).[13]

Entretanto e por outro lado, os delegados, representantes ou conselheiros secretos dos grandes senhores antecipavam-se às edições impressas e logo que tomaram conhecimento do regresso de Colon fizeram questão de divulgar tão impressionante notícia.

Há notícia da existência de uma cópia de uma primeira carta enviada de Barcelona, anónima e não datada mas datável de 31 de Março de 1493, dirigida ao Arcebispo de Tarragona, em que o Almirante é chamado de Coloma e se lhe atribui parentesco ao corsário francês Coullon[14]:

 

Datável: 31 Março 1493

Remetente: desconhecido

De: Barcelona

Destinatário: Arcebispo de Tarragona, Governador de Roma

Em: Roma

 

«Per questa faccio sapere ad V. Rev. S. che perseverando nostro Segnor Dio la bona fortuna de le soy Alteze, heri hanno recepute littere da uno che se dimanda Coloma, grandíssimo marinaro, nepote del grande Coloma de Francia, el qual mandarono soy Maiestate a con doy caravele verso la India ad cercare certe insule che erano incognite, in nelle quale haviva multo oro et spetie et com grande reccheze….

De quel che serra advesaro V. Rev. S. De Barzalona el dy de ramis… »

 

«Por esta dou a conhecer a Vossa Reverendíssima Senhoria que, por fortuna de Deus Nosso Senhor, Suas Altezas receberam ontem uma carta de um tal que se apelida de Coloma, grandíssimo marinheiro, neto/sobrinho do grande Coloma de França, e que fora enviado por Suas Majestades, com duas caravelas, para a Índia, à procura de umas certas ilhas incógnitas, nas quais haveria muito ouro e especiarias e com grande riqueza….

Encerro, Vossa Reverendíssima Senhoria, de Barcelona, no dia de ramos… »

 

E há várias cartas originais, das quais se conhece o remetente e o destinatário, enviadas de e para várias cidades de Espanha e de Estados Italianos.

Assim, em 9 de Abril, ainda o Almirante não tinha chegado a Barcelona para se encontrar com os Reis Católicos tal como estes lhe tinham ordenado, já os ecos da sua carta recebida pelos altos funcionários da Corte se propagavam de casa senhorial em casa senhorial e alcançavam também os grandes mercadores da península itálica, deturpando o nome que o identificava em Castela:

 

Data: 9 Abril 1493 [15]

Remetente: ANIBALLE ZENNARO

De: Barcelona

Destinatário: seu irmão, N. Zennaro, embaixador do Sacro Império

Em: Milão

 

«Magnifice frater honorandissime … et per vedere che in lo mese de agosto passato questi signori re, ad pregieri de uno ditto il Colomba, fuoro contenti che lo predicto armasse quatro caravelle, ad effecto che epso diceva volere andare per lo mare magior et navigare tanto per dritta linea, per ponente, per fine che venesse allo oriente, che essendo lo mondo ritondo, per forza haveva de voltare et trovare la parte orientale, et cussl fece … andarono per le case de quelli vicini et ville, dicendo che era venuto in quelle parte homo misso da Dio: per il che tutte quele gente, essendone di bona fede, contrassero con lo dicto Collomba et homini suoi strecto amore et amistà, … have lassato lo predicto Colomba là homini de li suoi. et prima partesse el principiò una forteza, la quale lassò fornita de victuaglie et artegliaria …  dicto Collomba è retornato in dreto, et ha preso terra in Lisbona, et ha scripto questo a questo signore re; et dicto signore re gli ha scripto che subito vengha qua. io credo haverò copia de la littera quale epso ha scripto, et ve la mandarò …

Barcellone, die .VIIII. martii .1493. [16]

Vester hobediens frater

Hanibal Ianuarius.»

 

«Magnífico irmão honorabilíssimo. … E para dizer-vos que no passado mês de Agosto estes senhores Reis, a pedido de um, dito o Colomba, agradou-lhes que o referido armasse quatro caravelas, para o efeito que ele dizia querer andar pelo mar maior e navegar tanto em linha direita para poente com o intuito de chegar ao oriente, pois sendo o mundo redondo, forçosamente haveria de dar a volta e achar a parte oriental, e assim fez …

… andaram pelas casas daqueles vizinhos e pelas aldeias dizendo que tinha chegado o homem enviado por Deus, pelo que toda aquela gente, sendo de boa fé, contraíu com o dito Collomba e os seus homens estreito amor e amizade…

O dito Colomba deixou lá homens seus e antes de partir começou uma fortaleza, a qual deixou fornecida de vitualhas e artilharia … O dito Collomba regressou directo e chegou a terra em Lisboa e escreveu isto a este senhor Rei; e o Rei escreveu-lhe que venha cá imediatamente. Eu creio que haverá cópia da carta que escreveu e enviar-vo-la-ei….

Barcelona, dia 9 de Março de 1493 [17]

Vosso obediente irmão

Aniballe Zennaro»[18]

 

 

Tendo recebido a carta de seu irmão com as notícias de Barcelona, o embaixador do Sacro Império em Milão não guardou a informação apenas para si e para o seu imperador. A regência do Ducado de Milão tinha sido tomada por Ludovico Sforza, il Moro, casado com uma filha do Duque de Ferrara, Ercole I de Este. O Duque de Ferrara tinha em Milão o seu conselheiro secreto Giacomo Trotti que recebeu uma cópia da carta de Aniballe Zennaro e a enviou para Ferrara com uma carta sua:

 

Data: 21 Abril 1493 [19]

Remetente: GIACOMO TROTTI

De: Milão

Destinatário: Duque de Ferrara

Em: Ferrara

 

«Al mio illustrissimo signore il signore duca de Ferrara &c.

Illustrissimo et excellentissimo signor mio observandissimo. Mando a vostra excellentia, in questa inclusa, una copia de littera, la quale questo magnífico ambasadore regio ha havuta da uno suo fratello che se retrova a Barzellona cum il serenissimo re de Hyspania. la quale littera ha havuto molto cara vedere lo illustrissimo signor Ludovico, et ne ha voluto copia, impero m'é parso etiam mandarla a vostra excellentia, a ciò che la intenda cosse nove…

Mediolani, .xxi. aprilis .1493.

Excellentie vestre servus

Iacobus Trottus.»

 

«Copia de litera directiva al magnifico oratore regio qua resydente.

(Magnifice frater honorandissime. In questi di ve ho scripto; …)»

 

«Ao meu ilustríssimo senhor, o Senhor Duque de Ferrara

Ilustríssimo e excelentíssimo senhor meu observantíssimo. Mando a vossa excelência, incluída nesta, uma cópia de carta, a qual este magnífico embaixador régio recebeu de um seu irmão que se encontra em Barcelona com o sereníssimo rei de Espanha. A qual carta muito desejou ver o ilustríssimo senhor Ludovico, e quis dela uma cópia e me pareceu bem enviá-la a vossa excelência, para que fique a saber das novidades …

Milão, 21 de Abril de 1493

Servidor de vossa excelência

Jacobo Trotti»

 

«Cópia de carta dirigida ao magnífico orador régio aqui residente.

(Magnífico irmão honorabilíssimo. Neste dia vos escrevo; …)»

 

As notícias tinham chegado também muito rapidamente a Florença, de onde Luca Fancelli enviou a informação para Mântua, numa carta datada de 22 de Abril:

 

 

Data: 22 Abril 1493 [20]

Remetente: LUCA FANCELLI

De: Florença

Destinatário: Francesco Marchioni

Em: Mântua

 

«Illustrissimo p[atron] et excellentissimo domino domino Francischo marchioni Mantue &c. domino meo singularissimo &c.

Illustrissimo et excellentissimo signior mio &c. Vostra signoria … havendo mandato el re di Spagnia alquni legni oltre al mar di Spagnia, che in tempo di . 1 6 . giornate schoprirono cierte ixole, infra le altre verso l'oriente una ixola grandísima la quale aveva grandisimi fiumi e teribile montagnie e molto fertiliximo paexe, e abitato da begli homeni e donne, ma vanno tuti ingniudi,.... e una quaxi grande chome Italia, e che que'fiumi menano oro, e che àno rame asai ma non ferro, e molte altre maraviglie, e che non si vede né 'l polo Artico nè l'Antarticho.

Data in Firenze a l’opera di Santa Liperata, .22. aprile .1493.

Vostro fidel servidor

Lucha ingieniere.»

 

«Ilustríssimo patrão e excelentíssimo senhor, Senhor Francisco Marchioni, Mântua.

Senhor meu singularíssimo

Ilustríssimo e excelentíssimo senhor meu; … tendo enviado o rei de Espanha alguns navios ao mar de Espanha, que em 16 dias descobriram umas ilhas, e abaixo delas para oriente uma ilha grandíssima a qual tinha grandes rios e enormes montanhas e terras muito férteis, habitada por belos homens e mulheres, mas andam todos nús … e uma quase tão grande como Itália, e muitas outras maravilhas, e não se vê nem o polo Ártico nem o Antártico.

Escrita em Florença em Santa Liberata, 22 de Abril 1493

Vosso fiel servidor

Luca, engenheiro»

 

Apenas quatro dias depois de Giacomo Trotti ter escrito ao Duque de Ferrara dando-lhe notícia da descoberta, já o Duque lhe respondia a agradecer as informações:

Data: 25 Abril 1493 [21]

Remetente: ERCOLE, DUCA DI FERRARA

De: Ferrara

Destinatário: Giacomo Trotti

Em: Milão

 

«Ad dominum Iacobum Trottum.

Messer Iacommo. II si è havuta una vostra de .xxi. del presente, et quanto sia per la prima parte, che parla de quella copia de litera de messer Hannibale de Zenaro data in Barzellona, che ne haveti mandata, in la quale se tracta de quelle insule, che di novo se sonó tróvate &c, … et se sentireti che sia scripto altro circa ciò a quello magnifico oratore regio lì è residente, haveremo caro ce ne diati aviso.

Ferrarie, .25. aprilis .1493.»

 

«Ao senhor Giacomo Trotti.

Senhor Giacomo. Recebi uma carta vossa de 21 do presente, e quanto seja pela primeira parte, que fala daquela cópia da carta do senhor Annibale Zennaro enviada de Barcelona, que me haveis mandado, na qual se trata daquelas ilhas que foram achadas pela primeira vez … e se soubéreis que sejam escritas outras coisas acerca disso àquele orador régio aí residente, agradecemos que nos aviseis.

Ferrara, 25 de Abril 1493»

 

***

Tendo chegado a Lisboa no dia 4 de Março e ancorado a caravela no Restelo, Christóval Colon foi, uns dias depois, acompanhado à presença do Rei D. João II de Portugal que se encontrava longe da capital do reino [22]:

 

«Sábado, 9 de marzo

Hoy partió de Sacamben para ir adonde el Rey estaba, que era el valle del Paraíso, nueve leguas de Lisboa: porque llovió no pudo llegar hasta la noche. El Rey le mandó recibir a los principales de su casa muy honradamente, y el Rey también le recibió con mucha honra y le hizo mucho favor y mandó sentar y habló muy bien, ofreciéndole que mandaría hacer todo lo que a los Reyes de Castilla y a su servicio cumpliese cumplidamente y más que por cosa suya; y mostró haber mucho placer del viaje haber habido buen término y se haber hecho, mas que entendía que en la capitulación que había entre los Reyes y él que aquella conquista le pertenecía  . A lo cual respondió el Almirante que no había visto la capitulación ni sabía otra cosa sino que los Reyes le habían mandado que no fuese a la Mina ni en toda Guinea, y que así se había mandado pregonar en todos los puertos del Andalucía antes que para el viaje partiese. El Rey graciosamente respondió que tenía él por cierto que no habría en esto menester terceros. Diole por huésped al prior del Clato, que era la más principal persona que allí estaba, del cual el Almirante recibió muy muchas honras y favores.»

 

«Sábado, 9 de Março

Hoje partiu de Sacavém para ir onde o Rei estava, que era o Vale do Paraíso, a nove léguas de Lisboa: porque choveu não pôde chegar antes da noite. O Rei mandou que os principais de sua casa o recebessem muito honradamente, e o Rei também o recebeu com muita honra e lhe fez muito favor e mandou sentar e falou muito bem, oferecendo-lhe que mandaria fazer tudo o que aos Reis de Castela e ao seu serviço cumprisse compridamente, mais do que se fosse coisa sua; e mostrou ter muito prazer pela viagem ter chegado a bom termo e ter-se realizado, mas que entendia que, no tratado que havia entre os Reis e ele, aquela conquista lhe pertencia. Ao que o Almirante respondeu que não tinha visto o tratado nem sabia outra coisa senão que os Reis lhe tinham mandado que não fosse à Mina nem a toda a Guiné, e que assim se tinha mandado apregoar em todos os portos de Andaluzia antes que partisse para a viagem. O Rei graciosamente lhe respondeu que tinha por certo que não haveria nisto intervenção de terceiros. Deu-lhe por anfitrião o Prior do Crato que era a mais importante pessoa que ali estava, de quem o Almirante recebeu muitas honras e favores»

 

A reacção do Rei de Portugal sobre o direito às terras alcançadas por Colon não se limitou àquilo que transmitiu logo nesse dia ao Almirante, dizendo-lhe que lhe pertenciam a si em função do tratado existente, referindo-se ao Tratado de Alcáçovas-Toledo.

Logo mandou preparar uma armada sob o comando de Dom Francisco de Almeida, que teria por missão ir ocupar as ilhas descobertas. Depois de umas semanas de reflexão em recolhimento no convento de Torres Vedras, o Rei de Portugal escreveu a Fernando de Aragão. Uma carta relativamente curta e bastante objectiva: Rui de Sande iria à corte dos Reis Católicos apresentar uma missiva mais longa em que D. João II demonstrava a sua posição sobre a navegação feita pelo Almirante, que tinha vindo ter a Lisboa por fortuna do mar e ao qual chamou simplesmente Dom Christovam.

D. João II conhecia muito bem Cristóvão Colon que consigo privara durante vários anos e a quem tinha também enviado uma carta para Sevilha, na qual lhe chamava Cristovam Colon.

Não era portanto por desconhecer o seu apelido que agora lhe chamava apenas Dom Christovam.[23]

 

Data: 3 Maio 1493 [24]

Remetente: D. JOÃO II, REI DE PORTUGAL

De: Torres Vedras

Destinatário: D. Fernando, Rei de Aragão e Castela

Em: Barcelona

 

«Ao muyto alto muyto excelente e poderosso princepe El Rey de castella d’aragam de sezilia de graada etc nosso muyto amado e preçado Irmaão.,

 

Muyto alto muyto exçellente e poderoso princepe Irmaão Nos dom Ioham per graça de deus Rey de portugal e dos algarues d’aaquem e d’aallem mar em africa e senhor de guinee vos enuiamos muyto saudar como aquelle que muyto amamos e preçamos.

veeo teer com fortuna do mar ao nosso porto da nossa cidade de lixboa dom christouam vosso almirante que folgamos muyto de veer e mandar tratar bem por ser cousa vossa,

E por vosso Respeito no caso que quisesse hir per terra por que mais çedo fosse a vos lhe mandamos dar cartas e auiamento pera despachadamente poder hir per nossos Reynos.,

E ouuemos muyto prazer de sua nauegaçom e por seu trabalho nom seer sem boom efecte asy da maneira que teue em comprir vosso mandado em sua nauegaçom acerqua do que a nos compria segundo nos certeficou e Nos a vossas cousas avemos sempre de fazer por as estimarmos e querermos como as nossas proprias, sobre o quall stpreuemos mais largamente a Rui de sande caualeiro de nossa casa e alcaide moor de torres vedras alguũas cousas que vos falara, Rogamos uos muy afectuosamente, praza uos dar lhe Inteira fe,

Muyto alto muyto excelente e poderoso princepe e Irmaão nosso senhor aIa vossa pessoa e Real stado em sua santa guarda,

stprita em torres vedras a iij dias de mayo de 1493 ∙

El Rey»[25]

 

Obviamente que os Reis Católicos se movimentaram de imediato, logo que souberam do regresso de Colon pela carta do Almirante com as notícias de ter descoberto e tomado posse, em nome dos seus soberanos, daquelas ilhas nas Índias. Na segunda quinzena de Abril chegava o Almirante a Barcelona com os indígenas que tinha recolhido, e era recebido triunfalmente.

A maior autoridade na época era o Papa, quem decidia atribuir o direito de conquista e cristianização nos territórios descobertos. O Papa Alexandre VI representava uma vantagem adicional para os interesses dos Reis Católicos, pois tratava-se do aragonês Rodrigo Borgia.

Por coincidência, precisamente na mesma data em que D. João II dirigia aquela carta ao Rei Fernando o Católico no dia 3 de Maio, a instâncias dos Reis Católicos o Papa emitia a Bula Inter Coetera favorável a Castela e Aragão:

 

Data: 3 Maio 1493 [26]

Bula Inter coetera

Emitente: PAPA ALEXANDRE VI

De: Vaticano, Roma

Destinatários; Fernando e Isabel, Reis de Castela, Leão, Aragão, Sicília e Granada

 

 

«Alexander episcopus, servus servorum Dei, carissimo in Christo filio Ferdinando regi et carissime in Christo filie Helisabeth regine Castelle, Legionis, Aragonum, Sicilie et Granate illustribus, salutem et apostolicam benedictionem. Inter cetera divine maiestati beneplacita opera et cordis nostri desiderabilia illud profecto potissimum existit…

…sed tandem, sicut Domino placuit, regno predicto [Granate] recuperato, volentes desiderium vestrum adimplere, dilectum filium Christoforum Colon cum navigiis et hominibus ad similia instructis, non sine maximis laboribus et periculis ac expensis destínastis, ut terras remotas et incognitas huiusmodi per mare, ubi hactenus navigatum non fuerat, diligenter inquirerent. qui tandem, divino auxilio, facta extrema diligentia, per partes occidentales, ut dicitur, versus Indos in mari Oceano navigantes, certas Ínsulas remotissimas et etiam terras firmas, que per alios hactenus reperte non fuerant, invenerunt;…

… sed de nostra mera liberalitate et ex certa scientia ac de apostolice potestatis plenitudine, omnes et singulas terras et insulas predictas, sic incognitas et hactenus per nuntios vestros repertas et reperiendas in posterum, que sub dominio actuali temporali aliquorum dominorum christianorum constitute non sint, auctoritate omnipotentís Dei nobis in beato Petro concessa ac vicariatus Yhesu Christi, qua fungimur in terris, cum omnibus illarum dominiis, civitatibus, castris, locis et villis, iuribusque et iurisdictionibus ac pertinentiis universis, vobis heredibusque et successoribus vestris, Castelle et Legionis regibus, in perpetuum, auctoritate apostolica, tenore presentium, donamus, concedimus et assignamus, vosque ac heredes et successores prefatos de illis investimus, illarumque dominos cum plena, libera et omnímoda potestate, auctoritate et iurisdictione facimus, constituimus et deputamus;…

 

… datum Rome, apud sanctum Petrum, anno incarnationis dominice MCCCCLXXXXIII, quinto nonas maii, pontificatus nostri anno primo.»

 

 

A Bula Inter Coetera dirigia-se especificamente aos Reis Fernando e Isabel de Castela, Leão, Aragão, Sicília e Granada descrevendo que após a recuperação do reino de Granada, com a graça de Deus e a vontade dos Reis, o dilecto filho Christoforum Colon com homens e navios, enfrentando grandes trabalhos e expondo-se a enormes perigos, navegando por mares anteriormente não navegados tentaram averiguar a existência de terras remotas e desconhecidas. E com o auxílio divino, navegando no mar Oceano em direcção às Índias nas partes ocidentais, descobriram certas ilhas e terras firmes que outros até então desconheciam.

O Papa, na plenitude do seu poder apostólico doa, concede e atribui aos Reis de Castela e Aragão, perpetuamente e depois aos seus herdeiros e sucessores o poder apostólico, direitos e jurisdição em todos os domínios, cidades, castelos, vilas e aldeias naquelas ilhas e terras firmes, descobertas e a descobrir…

Note-se que o nome próprio do navegador foi latinizado mas se manteve o seu apelido Colon.

Esta Bula contribuía para estabelecer um forte clima de tensão entre Portugal e os Reinos de Espanha, já preparado por D. João II quando comunicou a Colon que aquelas terras descobertas lhe pertenciam e se oficializou com a carta que o Rei de Portugal enviou a Fernando de Aragão no mesmo dia em que era emitida a Bula. Nessa carta, D. João II alertava já que ia enviar como embaixador Rui de Sande com mais desenvolvidos argumentos sobre as pretensões portuguesas.

Assim, com data do dia seguinte, 4 de Maio, mas considerada como tendo sido antedatada, o Vaticano expedia nova Bula, também denominada Inter Coetera, que repetia o essencial da Bula anterior mas estabelecia agora uma linha divisória, de polo a polo, a cem léguas dos Açores e de Cabo Verde, para ocidente e sul (sic) da qual se concediam os já referidos direitos aos Reis Católicos.

 

Data: 4 Maio 1493 [27]

Bula Inter coetera (II)

Emitente: PAPA ALEXANDRE VI

De: Vaticano, Roma

Destinatários; Fernando e Isabel, Reis de Castela, Leão, Aragão, Sicília e Granada

 

«Alexander episcopus,…

…, dilectum filium Christoforum Colon, …

… sed de nostra liberalitate et ex certa scientia ac de apostolic potestatis plenitude, omnes insulas et terras firmas inventas et inveniendas, detectas et detegendas, versus occidentem et meridiem, fabricando et constituindo unam lineam a polo artico, scilicet septemtrione, ad polum antarticum, scilicet meridiem, sive terra firme et insule invente et inveniende sint versus Indiam aut versus aliam quamcumque partem: que linea distet a qualibet insularum que vulgariter nuncupantur de los Azores et Caboverde centum leucis versus occidentem et meridiem, ita quod omnes insule et terre firme reperte et reperiende, detecte et detegende, a prefata linea versus occidentem et meridiem per alium regem aut principem christianum non fuerint actualiter possesse usque ad diem nativitatis domini nostri Yhesu Christi proxime preteritum, a quo incipit annus presens MCCCCLXXXX tertius, quando fuerint per nuntios et capitaneos vestros invente alique predictarum insularum, …

 

… datum Rome, apud sanctum Petrum, anno incarnationis dominice MCCCCLXXXXIII, quarto nonas maii, pontificatus nostri anno primo. »

 

Tratava-se já, obviamente, de uma tentativa dos Reis Católicos para contornar as pretensões portuguesas sustentadas pelo Tratado de Alcáçovas-Toledo, que atribuía a Portugal o direito à navegação e conquista para sul das Canárias, ‘contra Guiné’, ou seja no mar Oceano desde a costa africana. Daí provavelmente a inadequada expressão “para ocidente e sul da linha divisória de polo a polo” inscrita na Bula.

Não se tratava, no entanto, de uma ideia original dos Reis Católicos, pois numa carta que enviaram a Colon se dizia que tinha sido o Almirante a indicar que se fizesse a divisão por aquela linha.

 

Em sequência da Bula Papal que favorecia as suas pretensões, os Reis Católicos enviaram um emissário a Portugal para requerer que D. João II mandasse apregoar pelo reino que nenhuma caravela deveria navegar para as terras achadas pelo Almirante.

Ao que D. João II respondeu, por carta de 23 de Maio, dizendo que enviaria o seu emissário negociar com os Reis Católicos para que se resolvessem as divergências e fosse possível ‘tomar assento’, ou seja estabelecer acordo entre os Reinos. Acrescentando que entretanto suspenderia por dois meses o envio de navios portugueses àquelas partes.

Nesta carta D. João II referiu-se ao Almirante pelo nome de Cristovam Colombo, ou seja, divergia do nome do descobridor inscrito na Bula que dava origem ao conflito latente e divergia do nome pelo qual o Almirante era conhecido nos Reinos de Espanha.

Este facto suscita a questão de saber se teria sido aquele o nome do navegador em Portugal, ou se D. João II se limitava a repetir o nome que já figurava nas edições impressas da carta a Santangel ou se, na realidade, era o aproveitamento estratégico conveniente para afastar dos Reis Católicos a ideia de que o Almirante não lhes era inteiramente leal e tinha vindo a Portugal propositadamente relatar que as ilhas descobertas se encontravam a sul do paralelo das Canárias, e portanto na zona portuguesa do Tratado de Alcáçovas em vigor.

 

Data: 23 Maio 1493 [28]

Remetente: D. JOÃO II, REI DE PORTUGAL

De: Torres Vedras

Destinatário: D. Fernando, Rei de Aragão e Castela

Em: Barcelona

 

«Ao muyto alto muyto excelente e poderosso princepe El Rey de castella d’aragam de sezilia de graada etc nosso muyto amado e preçado Irmaão.,

 

Muyto alto muyto exçellente e poderoso princepe Irmaão Nos dom Ioham per graça de deus Rey de portugal e dos algarues d aaquem e d aallem mar em africa e senhor de guinee vos enuiamos muyto saudar como aquelle que muyto amamos e preçamos ., 
per elycius [sic] de Fyrreira vosso contino Recebemos huũa vossa carta de creença ., e ouuimos alguũas cousas que da vossa parte per vertude della nos disse , E quanto aos pregões e defesa que nos enuiaaes Requerer e que mandemos dar pera que nenhuũas carauellas e nauios de nossos Reynos e fora delles , nom vaão ao que ora nouamente achou dom christouam colombo vosso almirante ., se o dicto elycus [sic] de Fyrreira trouuera poder pera em vosso Nome fazer dar outros semelhantes em vossos Reynos e portos delles verdaderamente com muy boa vontade folgaramos de ho fazer por alguũ tempo , asy longuo e conuinhauel , em que se antre Nos podia bem assentar e lymitar os mares ylhas e terras vossas e Nossas porque doutra maneira pareçia que os dictos pregões se nom podiam bem dar sem sse seguirem disso alguũs Inconuenientes.Mas porque o dicto lopo de ferreira nos disse que nom trazia , o dicto vosso poder ., E sabendo que em Nossos Reynos se nom podem armar e abitalhar nauios de nossos naturaaes e estrangeiros , que com a aIuda de deus , Nos ho nom toruemos , o que asy faremos muy Inteiramente , ouuemos por bem de sobresseer nysso atee primeiro , per pessoas nossas que loguo a vos enuiamos com Nosso poder abastante se tomar nello çerto assento porque entonçes saberemos bem os pregoes e defesa que de huũa parte e da outra se ham de dar , e asy o que a vos e a nos pode pertençer ., 
E posto que teuessemos ordenados alguũs nauios que fossem descobrir muy alongados do que tinha descuberto o dicto almirante e mandassemos a Nossos capitaães e gentes do mar que asy ho fezessem e comprissem , pero por nom pareçer , enuiando Nos os dictos nauios em tal tempo, que antre Nos que tanto uos amamos , avia alguũa deferença o que nosso Senhor nom queira quisemos e nos praz de mandar sobresseer os dictos nauios que asy tinhamos prestes por dous meses despois da chegada das dictas nossas pessoas a vos , porque no dicto tempo se pode com a aIuda de deus em todo tomar tall assento , com que muy çerto se saiba onde vossos Nauios e nossos deuem e podem hir ., 
E esperamos em nosso Senhor que estas cousas se façom asy bem e com tanto prazer e acordo de todos que a paz , amjzade , Irmyndade e grande amor que antre Nos ha nom mingue , antes sse acreçente muyto mais e se conserue pera sempre , 
E o dicto lopo de ferreira com quem fallamos vos podera dizer que sentio de nossa vontade ser asy Inteira e boa ., como pera verdadeiro Irmaão que muyto amamos , 
Muyto alto muyto exçellente e poderoso prinçepe Irmaão ., Nosso Senhor aIa sempre vossa pessoa e Reall estado em sua santa guarda
stprita em torres vedras a xxiij dyas de mayo de 1493 •

a) El Rey»[29]

***

Enquanto decorria esta situação de conflitualidade entre os Reinos Ibéricos continuava a propagação das notícias sobre as ilhas encontradas pelos navios castelhanos no Ocidente.

E, em 10 de Maio, Giacommo Trotti enviava nova missiva ao seu senhor, o Duque de Ferrara. Para Trotti, que antes tinha enviado ao Duque a cópia da carta da Annibale Zennaro onde se designava o Almirante por Colomba / Collomba, esse Colomba, com quem ele não tinha contactado nem conhecia, seria um espanhol, ou pelo menos assim o designava nesta nova carta:

 

Data: 10 Maio 1493 [30]

Remetente: GIACOMO TROTTI

De: Milão

Destinatário: Ercole, Duque de Ferrara

Em: Ferrara

«Al mio illustrissimo signore il signore duca de Ferrara &c.

Scripssi a'dì passati a la vostra excellentia de quelle insole extranee trovate per quel Spagnolo, navicando, et li mandai la copia de una littera la quale me respondete che, se intendeva altro, gli ne desse adviso,…

Mediolani, .x. mai .1493.

Excellentie vestre servus

Iacobus Trottus.»

 

«Ao meu ilustríssimo senhor, O Senhor Duque de Ferrara,

Escrevi há uns dias a Vossa Excelência sobre aquelas ilhas estranhas encontradas por aquele Espanhol, navegando, e lhe enviei cópia de uma carta, sobre o que me respondeu que se eu soubesse de mais alguma coisa disso o avisasse, …

Milão 10 de Maio de 1493

Servidor de vossa excelência

Giacommo Trotti»

 

Também Pietro Martire, que tinha acompanhado o embaixador de Castela na Santa Sé, quando este regressou ao seu país em 1487, e ficara depois a leccionar em Salamanca era, nesta data do regresso de Colon, o capelão dos Reis Católicos, e escreveu ao seu protector Conde de Arona, dando conta do regresso do Almirante. Sem sequer o conhecer, como demonstra a expressão que utilizou para o mencionar, Pietro Martire decidiu chamar-lhe homem lígure [31], estabelecendo de alguma forma uma ligação à sua própria região natal na ‘Itália’, apesar de manter latinizado para Colonus o apelido Colon, sem o deturpar para Columbo:

 

Data: 14 Maio 1493 [32]

Remetente: PIETRO MARTIRE D’ANGHIERA

De: Barcelona

Destinatário: Giovanni Borromeo, Conde de Arona e Angera

Em: Arona

 

«rediit ab Antipodibus occiduis Christophorus quidam Colonus vir ligur, qui a meis regibus ad hanc provinciam triavix impetraverat navigia, quia fabulosa, que dicebat, arbitrabantur...»

 

«Regressou das Antípodas ocidentais um tal Cristoforo Colonus, homem lígure, que obteve dos meus reis três navios para visitar essas províncias, com muita dificuldade, na verdade, porque o que relatou foi tomado como sendo uma fábula»[33]

 

Pietro Martire produziu não apenas esta carta de Maio 1493 mas muitas mais até ao ano 1525, que foram depois reunidas nas publicações Opus Epistolarum e De Orbe Novo. Em 13 Setembro 1493 escreveu ao Conde de Tendilla e ao Arcebispo de Granada, no mesmo dia ao Cardeal Ascanio Sforza e em 1 de Outubro ao Arcebispo de Braga, todas elas relatando a chegada de Colonus. As cartas posteriores, já nos anos subsequentes, não abordaram a novidade da descoberta, mas continuaram a referir o Almirante, sempre designado como Colonus.  

A tensão entre os dois Reinos Ibéricos não passava despercebida aos olhos e ouvidos dos representantes de outros governantes e poderosos, e era agora também tema de informação valiosa conjuntamente com as notícias sobre as descobertas, como consta na carta do agente do Duque de Milão em Bolonha:

 

Data: 17 Junho 1493 [34]

Remetente: FRANCESCO TRANCHEDINI

De: Bolonha

Destinatário: Duque de Milão

Em: Milão

 

«Illustrissimo principi et excellentissimo domino domino meo observandissimo domino duci Mediolani.

Illustrissimo principe et .excellentissimo signore mio . . . . . Essendo retornato il barbero alleno(2) del magnifico messer Zoanne de verso Spagna con sei o sette zannetti, quali ha conducti, referisce che quello serenissimo et inclito re haviva preparata et in ponto una grossissima armata, quale era in ordine ad potere far vela … et per questa casone affirma epso barbero ch'el prefato re de Spagna remandava Columbo suo capitano a quella impresa con parechie charavelle e doe nave grosse et cum molta quantità di tele et altri panni, …

Ex Bononia, .xvii. iunii .1493.

Fidelissimus servus

Franciscus Tranchedinus.»

 

«Ilustríssimo principe e excelentíssimo senhor … Duque de Milão …

 

Tendo regressado de Espanha o treinador de cavalos do magnífico Senhor Giovanni, com seis ou sete ginetes, refere que aquele sereníssimo e ínclito Rei tinha preparada e pronta una enorme armada, a qual estava em ordem para partir … e nesta ocasião afirma o mesmo treinador que o mencionado Rei de Espanha reenviava Columbo seu capitão àquela empresa com várias caravelas e duas grandes naus e com muita quantidade de tecidos e outros panos…

De Bolonha, 17 de Junho de 1493

Fidelíssimo servidor

Francesco Tranchedini»

 

A difusão, a partir de Roma, da tradução para latim da carta do Almirante a Santangel,  adendada com o epigrama do Bispo de Montepeloso que deturpou o nome para Columbo, começara a produzir efeitos.

Como tal, a divulgação em grande escala dos impressos pela Europa substituiu a função desempenhada pelos diversos agentes das grandes casas até que se produziram novos acontecimentos. Durante vários meses após essas primeiras cartas foram as edições impressas que desempenharam o valioso papel que convinha tanto aos Reis Católicos como a Christóval Colon.

Só em Março do ano seguinte voltaram a circular as cartas endereçadas, agora com notícias sobre o regresso de parte da frota que tinha partido com o Almirante para a segunda viagem e com os primeiros relatos sobre esta.

 

Data: 19 Março 1494 [35]

Remetente: GIAMBATTISTA STROZZI

De: Cádiz

Destinatário: Duquesa de Mântua (?)

Em: Mântua

 

 

«Copia de una littera havuta da Calis a li .XVIIII. de marzo .1494.

 

A dì .vii. de questo arivorono qui a salvamento .XII. caravelle venute dalle nuove isole trovate per Colonbo savonese, armiraglio del Oceano per lo re de Castiglia, venute in di .xxv. dalle ditte isole d'Anteglia … arivorono qui sopra a Calis …senza mai descoprire altra terra, sono segnate ditte isole più de .XLIII., gradi .XXVI. in gradi .XXXI. sotto l'equinotio. …

Hanno portato horo circa ducati .30. mila, secondo dicono; canella assai, ma bianca come gengero mechino; pepe in bacelli come fava dirucata, fortissimo, ma non con sustantia come quello da Levante; legni dicono esser sandali, ma bianchi; pappagalli come falconi et rossi come fagiani. …. quest'altro viagio se saperà tutto.

Giovanbatista Strozi, in Calis.»

 

«Cópia de uma carta recebida de Cádiz, de 19 de Março de 1494

 

No dia 7 deste mês chegaram aqui a salvo 12 caravelas vindas das novas ilhas encontradas por Colonbo savonês, Almirante do Oceano pelo Rei de Castela, demorando 25 dias desde as ditas ilhas de Antilha,… chegaram aqui a Cádiz … sem terem ido à descoberta de outras terras, e assinalaram mais de 43 ilhas entre os 26 e os 31 graus abaixo do equinócio….

Trouxeram cerca de 30 mil ducados em ouro, segundo dizem, muita canela, mas branca como o gengibre, pimenta em vagem como as favas secas, fortíssima mas não com substância como aquela do Levante; madeira que dizem ser sândalo, mas branca; papagaios como falcões e vermelhos como faisões…. Desta outra viagem se saberá tudo.

Gianbattista Strozi, em Cádiz»

 

O epigrama do Bispo de Montepeloso adulterando o nome do descobridor começara a produzir efeitos, tal como produzia efeitos a origem logo apontada por Pietro Martir d’Anghiera. No espaço de um ano o navegador Christóval Colon era transformado num Colombo de Savona.

 

Data: 11 Junho 1494 [36]

Remetente: MORELLETTO PONZONE

De: Ferrara

Destinatário: Isabella, Duquesa de Mântua

Em: Mântua

 

«A la mia illustrissima madonna marchisana de Mantua, in Mantua.

A lo fato de Spagna, novamente uno chiamato Columbo si à trovato una certa isola per lo re de Spagna, in la quale ge sono homini de statura nostra, ma sono beretinazi (2) et ànno lo naso como simia; et lo primo de loro si à atachato in lo naso uno pezo de oro che gie copri la bocha … et le donne ànno la faza larga como una rutella, e tuti vano nudi, homini e donne;…

Data in Ferara, adì .11. zugno .1494.

Moreleto Ponzone de Cremona servitore.»

 

«À minha ilustríssima senhora marquesa de Mântua, em Mântua.

Sobre as coisas de Espanha, novamente um chamado Columbo encontrou uma certa ilha para o Rei d Espanha, na qual há homens com a nossa estatura, mas de cor parda avermelhada e têm o nariz como símios; e o primeiro deles tinha preso ao nariz um pedaço de ouro que lhe cobre a boca … e as mulheres têm a cara larga, arredondada, e todos andam nús, homens e mulheres

Escrita em Ferrara, dia 11 de Junho de 1494

Moreleto Ponzone de Cremona, vosso servidor»

 

Durante os dois anos seguintes não foram conhecidas novas cartas que se referissem ao Almirante, porque este estava então na sua segunda viagem para Ocidente. Mas a notícia do regresso voltou a ser remetida para as Repúblicas italianas, iniciada pelo chanceler do embaixador do Duque de Milão em Castela.

 

Data: 23 Junho 1496 [37]

Remetente: FRANCESCO LITTA

De: Almazán

Destinatário: Duque de Milão

Em: Milão

 

«El Colombo capitanio di queste maestá, quale discoperse le insule et parti per tornare in quelle, quando sue alteze stavano in Barzalona, che sonó cercha anni tri, é ritornato et dismontato in Cálice, et, per quello se dice, porta bona quantitá de oro, del quale ha trovato una vena, alia gionta sua qui se intenderá meglio la veritá, de la quale ne avisaró poi piü particularmente la signoria vostra.

Ex Almazano, die .23. iunii .1496.

Illustrissime dominationis vestre fidelissimus servus

Franciscus Litta.»

 

«O Colombo capitão destas Majestades, que descobriu as ilhas e partiu para tornar a elas quando suas Altezas estavam em Barcelona, há cerca de três anos, regressou e desembarcou em Cádiz e por aquilo que se diz traz boa quantidade de ouro, de que encontrou um veio, sobre o que se saberá melhor a verdade, da qual avisarei depois particularmente vossa senhoria.

De Almazan, 23 de Junho de 1496

Vosso fidelíssimo servidor do ilustríssimo senhor

Francesco Litta»

 

 

Data: 23 Junho 1496 [38]

Remetente: ANTONIO COSTABILI

De: Milão

Destinatário: Duque Ercole I de Ferrara

Em: Ferrara

 

«Avisi venuti de Hyspania,

Che Collono, capitaneo de l’armata hyspana, quale scoperse le insule trovate li anni proximi passati, era arrivato a Cales, et ha portato gran quantitate de oro, del quale ne ha trovato una vena …»

 

«Aviso vindo de Hispânia,[39]

Que Collono, capitão da armada hispana, que descobriu as ilhas encontradas nos anos próximos passados, tinha chegado a Cádiz, e trouxe grande quantidade de ouro, do qual encontrou um veio …»

 

***

 

O elucidativo silêncio da nação genovesa

 

Tendo então circulado nos Estados Italianos quer as correspondências pessoais (em Roma Florença, Ferrara, Milão, Mântua, Bolonha e Arona), quer os impressos da carta de Colon a Santangel (em Roma, Florença e Pavia), é notória uma ausência de muito peso: Génova!

 

Será que o descobrimento do Novo Mundo não foi merecedor de ser divulgado na República genovesa nem houve interesse desta em imprimir uma edição da carta? Principalmente atendendo ao facto de Pietro Martire ter classificado o Almirante como lígure e de Giambattista Strozzi lhe ter chamado savonês?

 

Tão mais comprometedora é a ausência de Génova na extensa lista porque na Historie a sua chegada a Portugal está relatada desta forma:

 

 

«Ma essendo l'Ammiraglio grandissimo nuotatore, e vedendosi due leghe o poco più discosto da terra, prendendo un remo che la sorte gli presentò, e aiutandosi con quello talvolta, e talaltra nuotando, piacque a Dio, che per altra maggior cosa l'aveva salvato, di dargli forze onde giungesse a terra, benché tanto stanco e travagliato dalla umidità dell'acqua che stette molti dì a rifarsi. E poiché non era lontano da Lisbona, dove sapeva che si ritrovavano molti della sua nazione genovese, più presto che potè si trasferì quivi dove, essendo conosciuto da loro, gli fu fatta tanta cortesia e sì buona accoglienza che mise casa in quella città e tolse moglie.» [40]

 

«Mas sendo o Almirante grande nadador, e vendo-se a duas léguas ou pouco mais distante de terra, tomando um remo que a sorte lhe apresentou, e ajudando-se com aquele umas vezes, e outras vezes nadando, graças a Deus que para um destino maior o salvou ao dar-lhe força para alcançar terra, apesar de muito cansado e tolhido pela humidade da água que demorou bastantes dias a recompor-se. E porque não estava longe d Lisboa, onde sabia que se encontravam muitos da sua nação genovesa, o mais cedo que conseguiu transferiu-se para aqui onde, sendo conhecido dles, lhe foi feita tanta cortesia e tão bom acolhimento que pôs casa naquela cidade e tomou mulher»

 

Portanto, o Colombo que se salvou nadando duas léguas em 1476 no Cabo de S. Vicente, dirigiu-se para Lisboa, onde havia uma grande comunidade genovesa, que o acolheu muito bem.

 

Pela história oficial seria esse mesmo Colombo genovês quem chegou mais uma vez a Lisboa, mas agora já como Almirante do Mar Oceano e Vice-Rei das Índias, regressado da viagem de descobrimento e conquista que acabara de fazer.

Pois a sua chegada não passou despercebida e infinitíssima gente foi ver os recém-chegados.

Foi, sem dúvida, o grande acontecimento daqueles anos finais do século XV.

 

«Miércoles, 6 de marzo

Sabido cómo el Almirante venía de las Indias, hoy vino tanta gente a verlo y a ver los indios, de la ciudad de Lisboa, que era cosa de admiración, y las maravillas que todos hacían, dando gracias a Nuestro Señor y diciendo que, por la gran fe que los Reyes de Castilla tenían y deseo de servir a Dios, que Su Alta Majestad los daba todo esto.» [41]

 

«Quarta-feira, 6 de Março

Sabendo-se que o Almirante vinha das Índias, hoje veio tanta gente da cidade de Lisboa, para vê-lo e para ver os índios que era coisa de admirar, e como todos estavam maravilhados, dando graças a Nosso Senhor e dizendo que, pela grande fé que os Reis de Castela tinham e o desejo de servir a Deus, que sua Alta Majestade lhes dava tudo isto.»

 

«Jueves, 7 de marzo

Hoy vino infinitísima gente a la carabela y muchos caballeros, y entre ellos los hacedores del Rey, y todos daban infinitísimas gracias a Nuestro Señor por tanto bien y acrecentamiento de la Cristiandad que Nuestro Señor había dado a los Reyes de Castilla, el cual dice que apropiaban porque Sus Altezas se trabajaban y ejercitaban en el acrecentamiento de la religión de Cristo.» [42]

 

«Quinta-feira, 7 de Março

Hoje veio infinitíssima gente à caravela e muitos cavaleiros, e entre eles os servidores do Rei, e todos davam infinitíssimas graças a Nosso Senhor por tanto bem e acrescentamento da Cristandade que Nosso Senhor tinha dado aos Reis de Castela, o que dizem ser apropriado porque Suas Altezas trabalhavam e exercitavam no engrandecimento da religião de Cristo»

 

Ninguém da grande comunidade genovesa em Lisboa, a mesma que acolheu Colombo quando ele cá chegou em 1476, se apercebeu do facto?

Nenhum dos seus certamente inúmeros amigos e conhecidos genoveses tomou a iniciativa de escrever ao Doge ou ao Conselho Aristocrático da República de Génova enaltecendo o enorme feito daquele seu compatriota que agora subia aos píncaros da fama?

E quando o Almirante se apresentou numa entrada triunfal em Barcelona, recebido apoteoticamente pelo povo e com grande pompa na Corte, nenhum delegado ou representante teve interesse em enviar a notícia para algum grande mercador genovês?

Acontece que em 1493, quando o Almirante colocou Barcelona em delírio, encontravam-se na Corte Aragonesa dois embaixadores da República de Génova, Francesco Marchesio e Giovanni Antonio Grimaldo que não puderam deixar de assistar aos acontecimentos daqueles dias.

Pois nos arquivos de Génova não se encontrou nenhuma correspondência sua a relatar o feito do conterrâneo que certamente entusiasmaria todo o povo genovês.

 

Bartolomeu Senarega, chanceler da República, produziu um manuscrito descrevendo os acontecimentos no período de 1488 a 1514, o qual foi incluído na colecção “Rerum Italicarum Scriptores” publicada por Ludovico Muratori já no século XVIII. O texto de Senarega “Genuensis de rebus genuensibus commentaria ab anno MCDLXXXVIII usque ad annum MDXIV” está incluído no Tomo XXIV, editado em 1738:

 

«Anno MCCCCXCIII

Redierunt per id tempus Franciscus Marchesius Jureconsultus, vir doctissimus, & Joannes Antonius Grimaldus, ambo viri providi, & de sua Patria bebemeriti, Oratores nostri ex Hispania, pace cum illis Regibus honestis conditionibus firmatâ. …

Ii etiam affirmaverunt, vera esse, quae de Insulis nuper repertis à Christophoro Columbu Genuensi dicta feruntur. …

Christophorus, & Bartholomaeus Columbi fratres Genuae plebejis parentibus ott, & lanificii mercede victitarunt. …

Sed Bartholomaeus minor natu in Lusitania demum Ulissipone constitit, ubi intentus quaestui, tabellis pingendis operam dedit. …» [43]

 

«Ano 1493

Regressaram por esse tempo Francesco Marchesio, ilustre jurisconsulto e Giovanni António Grimaldo, ambos homens eminentes e Embaixadores da Pátria ante os Reis de Espanha, com quem tinham firmado uma paz conveniente. Eles asseguraram como coisa certa o encontro feito pelo genovês Cristoforo Colombo de ilhas não conhecidas.

Os irmãos Cristoforo e Bartolomeu Colombo, genoveses de modesta ascendência e que viviam do comércio da lã. …


Bartolomeu, o mais novo, dirigiu-se a Portugal e por fim estabeleceu-se em Lisboa…»[44]

 

É Senarega quem escreve, já depois de 1514, que os embaixadores relataram em Génova, quando regressaram em 1493, os acontecimentos protagonizados por Colombo.

Mas em Génova não houve nenhuma reacção!

Nem sequer uns meses depois do regresso dos embaixadores, que aconteceu após 5 de Agosto, data em que assinaram um Tratado de comércio com os Reis Católicos. Em 4 de Outubro a Senhoria de Génova escreve aos Reis Fernando e Isabel anunciando a chegada dos embaixadores. Pois nessa carta não há nenhuma alusão ao que deveria ser grande motivo de orgulho para os genoveses, o de ter sido o compatriota Colombo o presumível herói da descoberta e conquista efectuada no Oceano:

 

«Deerat rebus tam preclaris ab ipsis [Maiestatibus vestris] gestis et studio in subditos, pace domi parta, purgato regno, subiecta ea Betice parte frustra alias a prioribus regibus tentata, quam Barbari, post Vandalorum incursionem, unde illi regioni nomen indictum est, per tot annis oceuparunt, perquisitis peniti'ssimis Oceani regionibus antehac ómnibus, ipsis etiam Romanis rerum dominis, ignotis, ut qui Aragonensi imperio subditi sunt, ipsi quoque nobiscum quieta pace frui possent. » [45]

 

É assim bastante elucidativo o silêncio e o alheamento da República de Génova face ao protagonismo do seu alegado cidadão no importantíssimo acontecimento e a conclusão é inevitável:

Não havia qualquer ligação ou relação entre o Almirante Christóval Colon e Génova.

 

 

APÊNDICE:

 

Diagramas de fluxo dos impressos da carta a Santángel e da correspondência enviada anunciando o regresso de Colon.

 



 

FONTES DOCUMENTAIS

 

Archivo General de Simancas:

Carta de Cristóbal Colon a Luis de Santángel, Escribano de Ración de sus Majestades, dando cuenta de su primer viaje a las Indias

http://pares.mcu.es/ParesBusquedas20/catalogo/description/4536674?nm

 

Archivo Histórico de la Nobleza:

Carta misiva de Juan II de Portugal a Fernando el Católico por la que le comunica la llegada de Cristóbal Colón al puerto de Lisboa, y que … http://pares.mcu.es/ParesBusquedas20/catalogo/description/12902084?nm

 

Carta misiva de Juan II de Portugal a Fernando el Católico por la que acepta paralizar las salidas de carabelas a descubrir " donde Cristóbal … 

http://pares.mcu.es/ParesBusquedas20/catalogo/description/12902085?nm

 

 

 

BIBLIOGRAFIA RELEVANTE

 

BERCHET, Guglielmo - Fonti italiane per la storia della scoperta dl Nuovo Mondo, in Raccolta di Documenti e Studi – Publicati dalla R. Comissione Colombiana – pel Quarto Centenario dalla Scoperta dall’America, Parte III, Vol. I, Roma: MDCCCXCVI.

 

COLÓN, Cristóbal - Diario de a bordo. Edición de Luis Arranz. Madrid: Editorial EDAF, 2006.

 

COLÓN, Hernando - Historie del S.D.FERNANDO COLOMBO; Nelle quali s'ha particolare, et vera relatione della vita, et de' fatti dell'Ammiraglio D.Christoforo Colombo, suo padre; Et dello scoprimento, ch'egli fece delle Indie Occidentali, dette Nuovo Mondo, hora possedute dal Sereniss. Re Catolico: Venetia, MDLXXI

 

DÁVILA, Maria Barreto – A mulher dos descobrimentos, D. Beatriz Infanta de Portugal. Lisboa: A Esfera dos Livros, 2019.

 

GONZÁLEZ CRUZ, David – Cristóbal Colon y la campaña propagandística del descubrimiento de América, in Versiones, propaganda y repercussiones del Descubrimiento de América. Madrid: Silex Ediciones, 2016

 

LOLLIS, Cesare de – Scritti di Cristoforo Colombo, in Raccolta di Documenti e Studi – Publicati dalla R. Comissione Colombiana – pel Quarto Centenario dalla Scoperta dall’America, Parte I, Vol. I. Roma: MDCCCXCVI.

 

PENNESE, Giuseppe – Pietro Martire d’Anghiera e le sue relazioni sulle scoperte oceaniche, in Raccolta di Documenti e Studi – Publicati dalla R. Comissione Colombiana – pel Quarto Centenario dalla Scoperta dall’America, Parte V, Vol. II, Roma: MDCCCXCVI.

 

PIEPER, Renate – Los ecos de los primeiros viajes de descubrimiento en el Sacro Império, in GONZÁLEZ CRUZ, David - Versiones, propaganda y repercussiones del Descubrimiento de América. Madrid: Silex Ediciones, 2016.

 

RUZZIN, Valentina – Tante cose se dicono que pareno incredebele – Lettera sulla scoperta dell’America. Atti della Società Ligure de Storia Patria, nº LVI. Génova: 2016

 

SENAREGA, Bartolomeo - “Genuensis de rebus genuensibus commentaria ab anno MCDLXXXVIII usque ad annum MDXIV” . Rerum Italicarum Scriptores, Tomo XXIV, Milão: Ed.Ludovico Muratori, Ex Tipographia Societatis Palatinae in Regia Curia. 1738



[1] O Autor escreve em conformidade com a ortografia que não avilta as raízes etimológicas da língua portuguesa.

[2] COLÓN, Cristóbal - Diario de a bordo. Edición de Luis Arranz. Madrid: Editorial EDAF, 2006.

[3] Tradução livre, pelo Autor, de todos os originais em castelhano incluídos no texto.

[4] Na transcrição que reproduzimos, publicada na Raccolta, consta a data de 4 de Março, mas no documento paleográfico do Archivo de Simancas (EST, LEG, 1,2,1,164) pode ler-se a data de xiiij de marzo. Neste dia 14 de Março foi quando o Almirante partiu de Lisboa para Castela. Ver Imagem 1.

[5] Vários autores chamam Rafael Sanchez ao tesoureiro de Aragão, provavelmente induzidos em erro pelo nome atribuído na tradução desta carta para latim. Gabriel é o nome nos documentos dos Archivos de España.

[6] LOLLIS, Cesare de - Scritti di Cristoforo Colombo, in Raccolta di Documenti e Studi – Publicati dalla R. Comissione Colombiana – pel Quarto Centenario dalla Scoperta dall’America, Parte I -Vol. I. Roma: MDCCCXCVI. Págs.120-135

Sobre a data do documento ver nota 4.

[7] Sobre a data do documento veja-se a nota 4 e a Imagem 1.

[8] Note-se que este documento arquivado em Simancas não está assinado por Colon, devendo ser uma cópia.

[9] GONZÁLEZ CRUZ, David – Cristóbal Colon y la campaña propagandística del descubrimiento de América, in Versiones, propaganda y repercussiones del Descubrimiento de América. Madrid: Silex Ediciones, 2016. Págs 21-64.

[10] No calendário romano, ‘tertio kalendas maii’ designava o terceiro dia contando regressivamente desde o primeiro dia (kalendas) de Maio. Corresponde, portanto, a 29 de Abril.

[11] Esta data na tradução latina, segue o calendário romano, em que ‘pridie idus Martii’ corresponde à data legível no documento paleográfico, 14 de Março.

[12] Tradução livre e simplificada, pelo autor, a partir da versão castelhana, in NAVARRETE, Martin Fernandez de – Coleccion de los viajes y descubrimientos que hicieran por mar los españoles. Tomo I. Segunda edición. Madrid: Imprenta Nacional, 1853. Págs.314-345

[13] PIEPER, Renate – Los ecos de los primeiros viajes de descubrimiento en el Sacro Império, in GONZÁLEZ CRUZ, David - Versiones, propaganda y repercussiones del Descubrimiento de América. Madrid: Silex Ediciones, 2016. Págs 145-160.

[14] RUZZIN, Valentina – Tante cose se dicono que pareno incredebele – Lettera sulla scoperta dell’America. Atti 

della Società Ligure de Storia Patria, nº LVI. Génova: 2016. Págs 329-343

[15] BERCHET, Guglielmo – Fonti italiane per la storia della scoperta dl Nuovo Mondo, in Raccolta di Documenti e Studi – Publicati dalla R. Comissione Colombiana – pel Quarto Centenario dalla Scoperta dall’America, Parte  III -Vol. I. Roma: MDCCCXCVI. Págs.141-142

[16] A data de 9 de Março está obviamente errada, como reconhecido até por Henry Harisse. Face a todos os

dados conhecidos será 9 de Abril. Mesmo que Colon tivesse escrito a sua carta em Lisboa no dia 4 de Março

não haveria tempo suficiente para chegar a Barcelona, a Corte decidir divulgá-la, Aniballe Zennaro tomar

conhecimento e escrever para Milão.

[17] Ver nota 15.

[18] Tradução livre, pelo Autor, de todos os originais em italiano, inseridos no texto.

[19] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág.141.

[20] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág.165.

[21] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág.144.

[22] COLÓN, Cristóbal - Diario de a bordo. Edición de Luis Arranz. Madrid: Editorial EDAF, 2006.

[23] Os membros da família real portuguesa e também os descendentes de D. Nuno Álvares Pereira não usavam apelido, cf. DÁVILA, Maria Barreto – A mulher dos descobrimentos, D. Beatriz Infanta de Portugal. Lisboa: A Esfera dos Livros, 2019. Pág. 18.

[24] Archivo Histórico de la Nobleza, VILLAGONZALO,CP.553,D.10

[25] Transcrição de Pedro Pinto, Centro de Estudos Históricos, Universidade NOVA de Lisboa, CHAM – Centro de Humanidades, FCSH, Universidade NOVA de Lisboa, Universidade dos Açores, in ph-colombina.blogspot.com, 15/06/2019

[26] BERCHET, Guglielmo – Op. cit.. Pág.5.

 

[27] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág.8.

[28] Archivo Histórico de la Nobleza, VILLAGONZALO,CP.553,D.10

[29] Transcrição de Pedro Pinto, Centro de Estudos Históricos, Universidade NOVA de Lisboa, CHAM – Centro de Humanidades, FCSH, Universidade NOVA de Lisboa, Universidade dos Açores, in Geneall Forum. https://geneall.net/pt/forum/186820/duas-cartas-de-d-joao-ii-ao-rei-de-castela-e-aragao-em-1493-achado-arquivistico-mas-noticia-com-d/#a415717

[30] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág. 143

[31] Curiosamente os lígures foram um dos povos que ocuparam o território do sul de Portugal, Alentejo / Algarve  

no séc. V a.C., cf. MELO. Amílcar – Portugal económico, político e social. Lisboa: Ed. Vieira da Silva, 2016. 

Págs.26- 27

[32] PENNESE, Giuseppe – Pietro Martire d’Anghiera e le sue relazioni sulle scoperte oceaniche, in Raccolta di 

Documenti e Studi – Publicati dalla R. Comissione Colombiana – pel Quarto Centenario dalla Scoperta

dall’America, Parte V, Vol. II, Roma: MDCCCXCVI. Pág.20

[33] Tradução do texto a partir da versão inglesa in BOURNE, Edward Gaylord – Spain in America. Ed. James  

Ward, 2003

[34] BERCHET, Guglielmo – Op. cit.. Pág. 194

[35] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág. 166.

[36] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág. 169.

[37] Idem, Pág. 195

[38] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág. 148.

[39] Trata-se de um grupo de avisos com datas entre 23 Junho e 9 Julho. Não é, portanto, a data em que foi

remetido de Milão

[40] COLON, Hernando - Historie, capitulo V, La venuta dell'Ammiraglio in Ispagna, e come si manifestò in 

Portogallo, da che ebbe causa lo scoprimento dell'Indie che egli fece. Veneza: Editora. Francesco de

Franceschi Sanese. 1571

[41] COLÓN, Cristóbal - Diario de a bordo. Edición de Luis Arranz. Madrid: Editorial EDAF, 2006.

[42] COLÓN, Cristóbal - Diario de a bordo. Edición de Luis Arranz. Madrid: Editorial EDAF, 2006.

[43] SENAREGA, Bartolomeo - Genuensis de rebus genuensibus commentaria ab anno MCDLXXXVIII usque ad

annum MDXIV, in MURATORI, Ludovico – Rerum Italicarum Scriptores, Tomo XXIV. Milão: Ex Tipographia

Societatis Palatinae in Regia Curia. Pág 534-537

[44] Tradução livre, pelo Autor, baseada na versão castelhana, in SANFUENTES Y CORREA, Henrique – 

Cristóbal Colón y su detractor El Marqués de Dos Fuentes. Santiago de Chile: Imprenta Universitaria, 1918.

[45] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág. 201.