O REGRESSO DE ‘COLOMBO’
DIVULGADO NOS REINOS EUROPEUS E NOS ESTADOS ITALIANOS
O elucidativo
silêncio da nação genovesa
Por: Carlos Calado[1]
A
4 de Março de 1493 chegava a Lisboa, no regresso da sua primeira viagem de
descoberta de novos mundos e povos desconhecidos, a caravela Niña capitaneada
pelo Almirante Christóval Colon. Para além da tripulação, trazia consigo alguns
indígenas que tinha tomado nas ilhas que alcançara na sua viagem.
Esse
momento histórico da chegada ficou registado no Diário de bordo[2] que o
Almirante prometera aos Reis Católicos antes da partida em Agosto do ano
anterior:
«Lunes, 4 de
marzo
…Venido el día, conoció la tierra, que era la Roca de Sintra, que es
junto con el río de Lisboa, adonde determinó entrar, porque no podía hacer otra
cosa: tan terrible era la tormenta que hacía en la villa de Cascaes, que es a
la entrada del río. Los del pueblo dice que estuvieron toda aquella mañana
haciendo plegarias por ellos, y, después que estuvo dentro, venía la gente a
verlos por maravilla de cómo habían escapado; y así, a hora de tercia, vino a
pasar a Rastelo dentro del río de Lisboa,…»
«Segunda Feira, 4 de
Março
… Ao romper do dia
reconheceu a terra, que era a Roca de Sintra, que está junto ao rio de Lisboa,
onde decidiu entrar, porque não podia fazer outra coisa: tão terrível era a
tormenta que fazia na vila de Cascais, que fica na entrada do rio. Disse que os
da povoação estiveram toda a manhã a rezar preces por eles e, depois de entrar,
vinha a gente para vê-los, pela maravilha de terem escapado; e assim, pela hora
das terças foi até ao Restelo, dentro do rio de Lisboa …» [3]
Desde
Lisboa foi enviada uma carta, ou duas cartas idênticas, do Almirante para os
altos funcionários dos Reis Católicos, Luis de Santangel e Gabriel Sanchez.
Nessas cartas descrevia-se o essencial de toda a viagem até ao dia 15 de
Fevereiro, ‘sobre as ilhas de Canária’ conforme o final das cartas. Na verdade,
segundo os registos no Diário, nesse dia 15 Colon encontrava-se nos Açores…
Já
em Lisboa o Almirante juntou-lhe uma adenda explicando que, quando já estava no
‘mar de Castela’, uma tempestade o arrastara para Lisboa. Na verdade, segundo
os registos no Diário, já estava perto de Lisboa quando a tempestade se terá
dado. E não estivera no mar de Castela como escreveu:
Data: 15
Fevereiro - 14 Março 1493 [4]
Remetente:
O ALMIRANTE
De: Lisboa
Destinatário(s):
Luis de Santangel / Gabriel Sanchez [5]
Em: Castela
e Aragão
«Señor, porque sé que avréis plazer de la gran
vitoria que Nuestro Señor me ha dado en mi viaje, vos escrivo esta, por la qual
sabréys como en .XXXIII. días
pasé de las islas de Canaria á las Indias con la armada que los ilustrísimos
rey é reyna nuestros señores me dieron, donde yo fallé muy muchas islas
pobladas con gente sin número; y d'ellas todas he tomado posesión por Sus
Altezas con pregón y vandera real estendida, y no me fué contradicho. …
…
adonde toda la christiandad deve tomar alegría y fazer grandes fiestas, y dar
gracias solemnes á la Sancta Trinidad … en tornándose tantos pueblos á nuestra
sancta fe, y después por los bienes tenporales ; que no solamente la España,
mas todos los christianos ternán aquí refrigerio y ganancia. …
…
Esto, según el fecho, así en breve.
Fecha
en la caravela, sobre las yslas de Canaria, á .xv. de febrero, año mil
.cccclxxxxiii.
Farà lo que mandaréys
El almirante.»
«anima que venia
dentro en la carta»
«Después
d' esta escripto, y estando en mar de Castilla, salió tanto viento conmigo sul
y sueste, que me ha fecho descargar los navios, pero corrí aqui en este puerto
de Lisbona oy, que fué la mayor maravilla del mundo, adonde acordé escrivir á
Sus Altezas, en todas las Yndias he siempre hallado los temporales como en
mayo; adonde yo fuy en .XXXIII.
días, y volví en .XXVIII., salvo
qu' estas tormentas me an detenido .XIIII.
días corriendo por esta mar. dizen aquá todos los hombres de la mar que jamás
ovo tan mal yvierno ni tantas pérdidas de naves.
Fecha á .iiii. días
de marzo.»[6]
«Senhor, porque sei que
tereis prazer na grande vitória que Nosso Senhor me deu na minha viagem, vos
escrevo esta, pela qual sabereis que em 33 dias passei das ilhas das Canárias
às Índias com a armada que os ilustríssimos rei e rainha nossos senhores me
deram, onde eu achei muitas ilhas povoadas por inúmera gente; e de todas elas
tomei posse com pregão e bandeira real estendida, e não me foi contrariado…
… onde toda a
cristandade deve alegrar-se e fazer grandes festas, e dar graças solenes à
Santa Trindade com muitas orações … por se converterem tantos povos à nossa
santa fé e depois pelos bens temporais; que não apenas Espanha mas todos os
cristãos tenham aqui refrigério e lucro …
Isto, conforme os
factos, assim resumido.
Feita na caravela, sobre
as ilhas das Canárias, a 15 de Fevereiro do ano de 1493
Fará o que mandáreis
O Almirante»
«Adenda que vinha dentro
da carta»
«Depois desta escrita, e
estando no mar de Castela, levantou-se tanto vento sul e sueste que me fez
descarregar os navios, mas corri para este porto de Lisboa hoje, que foi a
maior maravilha do mundo, de onde decidi escrever a Vossas Altezas. Em todas as
Índias encontrei sempre os tempoarais como os de Maio; onde eu fui em 23 dias e
regressei em 28, salvo que estas tormentas me detiveram 13 dias correndo por
este mar. Dizem aqui todos os homens do mar que jamais ouve tal inverno nem
tantas perdas de navios.
Feita a 4 dias de Março»
[7]
Imagem
1: data no final da adenda à carta a Santangel [8]
Esta
carta enviada aos altos funcionários reais deu origem não só a um enorme
entusiasmo curioso entre os dignatários da velha Europa como também à maior
acção propagandística de que há memória naquelas épocas.[9]
Foi
imediatamente impressa em Barcelona, tanto em castelhano como em catalão,
traduzida para latim e outros idiomas, impressa em vários países e difundida um
pouco por toda a Europa.
Esta
propaganda atingia um duplo objectivo: começou por servir a Cristóvão Colon que
via reconhecidos os seus direitos a títulos, altos cargos e rendimentos de
grande valor potencial e servia os Reis Católicos no seu desejo de receber a
bênção papal para colonizar aquelas terras e cristianizar os seus povos.
A
versão castelhana do relato foi também parcialmente reproduzida em Sevilha.
Roma foi o grande centro difusor pela Europa. Ali se publicaram nove edições em
latim ainda no ano 1493 e mais uma no ano seguinte.
À
tradução para latim da autoria de Aliander de Cosco publicada em Roma por
Stephanus Planck em 29 de Abril de 1493 [10], não
faltaram algumas imprecisões. Mas o mais influente e nefasto contributo para
estabelecer a confusão que tem perdurado por cinco séculos foi dado pelo Bispo
de Montepeloso, R.L. Corbaria, no epigrama laudatório aposto no final da
tradução. O nome do descobridor, que já fora escrito Colom na edição de
Barcelona por Pedro Posa, foi impropriamente transformado em Columbo:
«Epistola
Christofori Colom, cui etas nostra
multum debet, de insulis Indie supra Gangem nuper inventis, ad quas
perquirendas, octavo antea mense, auspiciis et ere invictissimi Fernandi
Hispaniarum regis missus fuerat, ad magnificimi dominum Raphaelem Sanxis, eiusdem
serenissimi regis tesaurarium, missa, quam nobilis ac litteratus vir Aliander
de Cosco ab hispano idiomate in latinum convertit. tertio kalendas maii .MCCCCLXXXXIII. pontificatus Alexandri
sexti anno primo.
(…)
Hec,
ut gesta sunt, sic breviter enarrata, vale.
Ulisbone,
pridie idus martii.[11]
Christoforus Colom, oceanee classis
prefectus.»
«Epigramma
R.L. de Corbaria, episcopi Montispalusii, ad invictissimum regem Hispaniarum.
IAM nulla hispanis tellus addenda triumphis, atque parum
tantis viribus orbis erat, nunc longe eois regio deprensa sub undis auctura est
titulos, Betice magne, tuos. unde repertori merito referenda Columbo gratia, sed summo est maior
habenda Deo, qui vincenda parat nova regna tibique sibique, teque simul fortem
prestat et esse pium.»
«Carta de Cristóbal Colom, a quem é muito devedora a nossa época, pelas ilhas
da Índia, achadas há pouco sobre o Ganges, e a cuja conquista tinha sido
enviado fez oito meses, a expensas dos invictíssimos Reis das Espanhas,
Fernando e Isabel; dirigida ao magnífico Sr. Rafael Sanchez, tesoureiro dos
mesmos sereníssimos monarcas e traduzida do espanhol para latim pelo generoso e
literato Leandro de Cozco em 29 de Abril de 1493, primeiro ano do Pontificado
de Alexandre VI.
(…)
Tais são os acontecimentos que
descrevi resumidamente. A Deus.
Em Lisboa a catorze de Março
Cristóbal
Colom, Almirante da Armada do Oceano.»
«Epigrama de R.L. de Corbaria, Bispo
de Montepeloso, ao Invictíssimo rei das Espanhas
Já não resta a Espanha terra alguma
onde o seu esclarecido estandarte não ondule e triunfe (…)
Ao imortal Columbo louvor eterno e recordação de um povo agradecido. (…)» [12]
A
estas publicações da carta em Roma (10 edições) seguiram-se várias outras
reproduções, em Florença e Pavia (2) na península itálica, Paris (3),
Antuérpia, Leipzig e Basileia (3). A partir desta última cidade deu-se a
propagação no Sacro Império, para Strasburgo, Nuremberga, Augsburgo e
Reutlingen (2).[13]
Entretanto
e por outro lado, os delegados, representantes ou conselheiros secretos dos
grandes senhores antecipavam-se às edições impressas e logo que tomaram
conhecimento do regresso de Colon fizeram questão de divulgar tão
impressionante notícia.
Há
notícia da existência de uma cópia de uma primeira carta enviada de Barcelona,
anónima e não datada mas datável de 31 de Março de 1493, dirigida ao Arcebispo
de Tarragona, em que o Almirante é chamado de Coloma e se lhe atribui parentesco ao corsário francês Coullon[14]:
Datável:
31 Março 1493
Remetente:
desconhecido
De:
Barcelona
Destinatário:
Arcebispo de Tarragona, Governador de Roma
Em:
Roma
«Per questa faccio sapere ad V. Rev. S. che perseverando nostro Segnor
Dio la bona fortuna de le soy Alteze, heri hanno recepute littere da uno che se
dimanda Coloma, grandíssimo
marinaro, nepote del grande Coloma de Francia, el qual mandarono soy Maiestate
a con doy caravele verso la India ad cercare certe insule che erano incognite,
in nelle quale haviva multo oro et spetie et com grande reccheze….
De quel che serra advesaro V. Rev. S. De Barzalona el dy de ramis… »
«Por esta dou a conhecer
a Vossa Reverendíssima Senhoria que, por fortuna de Deus Nosso Senhor, Suas
Altezas receberam ontem uma carta de um tal que se apelida de Coloma,
grandíssimo marinheiro, neto/sobrinho do grande Coloma de França, e que fora
enviado por Suas Majestades, com duas caravelas, para a Índia, à procura de
umas certas ilhas incógnitas, nas quais haveria muito ouro e especiarias e com
grande riqueza….
Encerro, Vossa
Reverendíssima Senhoria, de Barcelona, no dia de ramos… »
E
há várias cartas originais, das quais se conhece o remetente e o destinatário,
enviadas de e para várias cidades de Espanha e de Estados Italianos.
Assim,
em 9 de Abril, ainda o Almirante não tinha chegado a Barcelona para se
encontrar com os Reis Católicos tal como estes lhe tinham ordenado, já os ecos
da sua carta recebida pelos altos funcionários da Corte se propagavam de casa
senhorial em casa senhorial e alcançavam também os grandes mercadores da
península itálica, deturpando o nome que o identificava em Castela:
Data: 9
Abril 1493 [15]
Remetente:
ANIBALLE ZENNARO
De:
Barcelona
Destinatário:
seu irmão, N. Zennaro, embaixador do Sacro Império
Em: Milão
«Magnifice
frater honorandissime … et per vedere che in lo mese de agosto passato questi
signori re, ad pregieri de uno ditto il
Colomba, fuoro contenti che lo predicto armasse quatro caravelle, ad
effecto che epso diceva volere andare per lo mare magior et navigare tanto per
dritta linea, per ponente, per fine che venesse allo oriente, che essendo lo
mondo ritondo, per forza haveva de voltare et trovare la parte orientale, et
cussl fece … andarono per le case de quelli vicini et ville, dicendo che era venuto
in quelle parte homo misso da Dio: per il che tutte quele gente, essendone di
bona fede, contrassero con lo dicto Collomba
et homini suoi strecto amore et amistà, … have lassato lo predicto Colomba là homini de li suoi. et prima
partesse el principiò una forteza, la quale lassò fornita de victuaglie et
artegliaria … dicto Collomba è retornato in dreto, et ha preso terra in Lisbona, et ha
scripto questo a questo signore re; et dicto signore re gli ha scripto che
subito vengha qua. io credo haverò copia de la littera quale epso ha scripto,
et ve la mandarò …
Barcellone,
die .VIIII. martii .1493. [16]
Vester
hobediens frater
Hanibal
Ianuarius.»
«Magnífico irmão honorabilíssimo. … E
para dizer-vos que no passado mês de Agosto estes senhores Reis, a pedido de
um, dito o Colomba, agradou-lhes que
o referido armasse quatro caravelas, para o efeito que ele dizia querer andar
pelo mar maior e navegar tanto em linha direita para poente com o intuito de
chegar ao oriente, pois sendo o mundo redondo, forçosamente haveria de dar a
volta e achar a parte oriental, e assim fez …
… andaram pelas casas daqueles
vizinhos e pelas aldeias dizendo que tinha chegado o homem enviado por Deus,
pelo que toda aquela gente, sendo de boa fé, contraíu com o dito Collomba e os seus homens estreito amor
e amizade…
O dito Colomba deixou lá homens seus e antes de partir começou uma
fortaleza, a qual deixou fornecida de vitualhas e artilharia … O dito Collomba regressou directo e chegou a
terra em Lisboa e escreveu isto a este senhor Rei; e o Rei escreveu-lhe que
venha cá imediatamente. Eu creio que haverá cópia da carta que escreveu e
enviar-vo-la-ei….
Barcelona, dia 9 de Março de 1493 [17]
Vosso obediente irmão
Aniballe Zennaro»[18]
Tendo
recebido a carta de seu irmão com as notícias de Barcelona, o embaixador do
Sacro Império em Milão não guardou a informação apenas para si e para o seu
imperador. A regência do Ducado de Milão tinha sido tomada por Ludovico Sforza,
il Moro, casado com uma filha do Duque de Ferrara, Ercole I de Este. O Duque de
Ferrara tinha em Milão o seu conselheiro secreto Giacomo Trotti que recebeu uma
cópia da carta de Aniballe Zennaro e a enviou para Ferrara com uma carta sua:
Data: 21
Abril 1493 [19]
Remetente:
GIACOMO TROTTI
De: Milão
Destinatário:
Duque de Ferrara
Em: Ferrara
«Al
mio illustrissimo signore il signore duca de Ferrara &c.
Illustrissimo et excellentissimo signor mio
observandissimo. Mando a vostra excellentia, in questa inclusa, una copia de
littera, la quale questo magnífico ambasadore regio ha havuta da uno suo
fratello che se retrova a Barzellona cum il serenissimo re de Hyspania. la
quale littera ha havuto molto cara vedere lo illustrissimo signor Ludovico, et
ne ha voluto copia, impero m'é parso etiam mandarla a vostra excellentia, a ciò
che la intenda cosse nove…
Mediolani,
.xxi. aprilis .1493.
Excellentie
vestre servus
Iacobus
Trottus.»
«Copia
de litera directiva al magnifico oratore regio qua resydente.
(Magnifice frater
honorandissime. In questi di ve ho scripto; …)»
«Ao meu ilustríssimo senhor, o Senhor
Duque de Ferrara
Ilustríssimo e
excelentíssimo senhor meu observantíssimo. Mando a vossa excelência, incluída
nesta, uma cópia de carta, a qual este magnífico embaixador régio recebeu de um
seu irmão que se encontra em Barcelona com o sereníssimo rei de Espanha. A qual
carta muito desejou ver o ilustríssimo senhor Ludovico, e quis dela uma cópia e
me pareceu bem enviá-la a vossa excelência, para que fique a saber das
novidades …
Milão, 21 de Abril de
1493
Servidor de vossa excelência
Jacobo Trotti»
«Cópia de carta dirigida
ao magnífico orador régio aqui residente.
(Magnífico irmão
honorabilíssimo. Neste dia vos escrevo; …)»
As
notícias tinham chegado também muito rapidamente a Florença, de onde Luca
Fancelli enviou a informação para Mântua, numa carta datada de 22 de Abril:
Data: 22
Abril 1493 [20]
Remetente:
LUCA FANCELLI
De:
Florença
Destinatário:
Francesco Marchioni
Em: Mântua
«Illustrissimo
p[atron] et excellentissimo domino domino Francischo marchioni Mantue &c.
domino meo singularissimo &c.
Illustrissimo et excellentissimo signior mio &c. Vostra
signoria … havendo mandato el re di Spagnia alquni legni oltre al mar di
Spagnia, che in tempo di . 1 6 . giornate schoprirono cierte ixole, infra le
altre verso l'oriente una ixola grandísima la quale aveva grandisimi fiumi e
teribile montagnie e molto fertiliximo paexe, e abitato da begli homeni e
donne, ma vanno tuti ingniudi,.... e una quaxi grande chome Italia, e che
que'fiumi menano oro, e che àno rame asai ma non ferro, e molte altre
maraviglie, e che non si vede né 'l polo Artico nè l'Antarticho.
Data
in Firenze a l’opera di Santa Liperata, .22. aprile .1493.
Vostro
fidel servidor
Lucha
ingieniere.»
«Ilustríssimo patrão e excelentíssimo
senhor, Senhor Francisco Marchioni, Mântua.
Senhor meu singularíssimo
Ilustríssimo e excelentíssimo senhor
meu; … tendo enviado o rei de Espanha alguns navios ao mar de Espanha, que em
16 dias descobriram umas ilhas, e abaixo delas para oriente uma ilha
grandíssima a qual tinha grandes rios e enormes montanhas e terras muito
férteis, habitada por belos homens e mulheres, mas andam todos nús … e uma
quase tão grande como Itália, e muitas outras maravilhas, e não se vê nem o
polo Ártico nem o Antártico.
Escrita em Florença em Santa Liberata,
22 de Abril 1493
Vosso fiel servidor
Luca, engenheiro»
Apenas quatro
dias depois de Giacomo Trotti ter escrito ao Duque de Ferrara dando-lhe notícia
da descoberta, já o Duque lhe respondia a agradecer as informações:
Data: 25
Abril 1493 [21]
Remetente: ERCOLE,
DUCA DI FERRARA
De: Ferrara
Destinatário:
Giacomo Trotti
Em: Milão
«Ad
dominum Iacobum Trottum.
Messer Iacommo. II si è havuta una vostra de .xxi.
del presente, et quanto sia per la prima parte, che parla de quella copia de
litera de messer Hannibale de Zenaro data in Barzellona, che ne haveti mandata,
in la quale se tracta de quelle insule, che di novo se sonó tróvate &c, …
et se sentireti che sia scripto altro circa ciò a quello magnifico oratore
regio lì è residente, haveremo caro ce ne diati aviso.
Ferrarie,
.25. aprilis .1493.»
«Ao senhor Giacomo
Trotti.
Senhor Giacomo. Recebi
uma carta vossa de 21 do presente, e quanto seja pela primeira parte, que fala
daquela cópia da carta do senhor Annibale Zennaro enviada de Barcelona, que me
haveis mandado, na qual se trata daquelas ilhas que foram achadas pela primeira
vez … e se soubéreis que sejam escritas outras coisas acerca disso àquele
orador régio aí residente, agradecemos que nos aviseis.
Ferrara, 25 de Abril
1493»
***
Tendo chegado
a Lisboa no dia 4 de Março e ancorado a caravela no Restelo, Christóval Colon
foi, uns dias depois, acompanhado à presença do Rei D. João II de Portugal que
se encontrava longe da capital do reino [22]:
«Sábado, 9 de marzo
Hoy partió de
Sacamben para ir adonde el Rey estaba, que era el valle del Paraíso, nueve
leguas de Lisboa: porque llovió no pudo llegar hasta la noche. El Rey le mandó
recibir a los principales de su casa muy honradamente, y el Rey también le
recibió con mucha honra y le hizo mucho favor y mandó sentar y habló muy bien,
ofreciéndole que mandaría hacer todo lo que a los Reyes de Castilla y a su
servicio cumpliese cumplidamente y más que por cosa suya; y mostró haber mucho
placer del viaje haber habido buen término y se haber hecho, mas que entendía
que en la capitulación que había entre los Reyes y él que aquella conquista le
pertenecía . A lo cual respondió el Almirante que no había visto la
capitulación ni sabía otra cosa sino que los Reyes le habían mandado que no
fuese a la Mina ni en toda Guinea, y que así se había mandado pregonar en todos
los puertos del Andalucía antes que para el viaje partiese. El Rey
graciosamente respondió que tenía él por cierto que no habría en esto menester
terceros. Diole por huésped al prior del Clato, que era la más principal
persona que allí estaba, del cual el Almirante recibió muy muchas honras y
favores.»
«Sábado, 9 de Março
Hoje partiu de Sacavém
para ir onde o Rei estava, que era o Vale do Paraíso, a nove léguas de Lisboa:
porque choveu não pôde chegar antes da noite. O Rei mandou que os principais de
sua casa o recebessem muito honradamente, e o Rei também o recebeu com muita
honra e lhe fez muito favor e mandou sentar e falou muito bem, oferecendo-lhe
que mandaria fazer tudo o que aos Reis de Castela e ao seu serviço cumprisse
compridamente, mais do que se fosse coisa sua; e mostrou ter muito prazer pela
viagem ter chegado a bom termo e ter-se realizado, mas que entendia que, no
tratado que havia entre os Reis e ele, aquela conquista lhe pertencia. Ao que o
Almirante respondeu que não tinha visto o tratado nem sabia outra coisa senão
que os Reis lhe tinham mandado que não fosse à Mina nem a toda a Guiné, e que
assim se tinha mandado apregoar em todos os portos de Andaluzia antes que
partisse para a viagem. O Rei graciosamente lhe respondeu que tinha por certo
que não haveria nisto intervenção de terceiros. Deu-lhe por anfitrião o Prior
do Crato que era a mais importante pessoa que ali estava, de quem o Almirante
recebeu muitas honras e favores»
A
reacção do Rei de Portugal sobre o direito às terras alcançadas por Colon não
se limitou àquilo que transmitiu logo nesse dia ao Almirante, dizendo-lhe que
lhe pertenciam a si em função do tratado existente, referindo-se ao Tratado de
Alcáçovas-Toledo.
Logo
mandou preparar uma armada sob o comando de Dom Francisco de Almeida, que teria
por missão ir ocupar as ilhas descobertas. Depois de umas semanas de reflexão
em recolhimento no convento de Torres Vedras, o Rei de Portugal escreveu a
Fernando de Aragão. Uma carta relativamente curta e bastante objectiva: Rui de
Sande iria à corte dos Reis Católicos apresentar uma missiva mais longa em que
D. João II demonstrava a sua posição sobre a navegação feita pelo Almirante,
que tinha vindo ter a Lisboa por fortuna do mar e ao qual chamou simplesmente
Dom Christovam.
D.
João II conhecia muito bem Cristóvão Colon que consigo privara durante vários
anos e a quem tinha também enviado uma carta para Sevilha, na qual lhe chamava
Cristovam Colon.
Não
era portanto por desconhecer o seu apelido que agora lhe chamava apenas Dom Christovam.[23]
Data: 3
Maio 1493 [24]
Remetente:
D. JOÃO II, REI DE PORTUGAL
De: Torres
Vedras
Destinatário:
D. Fernando, Rei de Aragão e Castela
Em:
Barcelona
«Ao muyto alto muyto excelente e poderosso princepe El Rey de castella d’aragam de sezilia de graada etc nosso muyto amado e preçado Irmaão.,
Muyto alto muyto exçellente e poderoso princepe Irmaão Nos dom Ioham per graça de deus Rey
de portugal e dos
algarues d’aaquem e d’aallem mar em africa e senhor de guinee vos enuiamos muyto saudar como aquelle que muyto amamos e preçamos.
veeo teer com fortuna do mar ao nosso porto da nossa cidade de lixboa dom christouam vosso almirante que folgamos muyto de veer e mandar tratar bem por ser cousa vossa,
E por vosso
Respeito no caso que quisesse hir per terra por que mais çedo fosse a vos lhe mandamos
dar cartas e auiamento
pera despachadamente poder hir
per nossos Reynos.,
E ouuemos muyto prazer de sua nauegaçom e por seu trabalho nom seer
sem boom efecto e asy da maneira
que teue em comprir vosso mandado em sua nauegaçom
acerqua do que a nos compria segundo nos certeficou e Nos
a vossas cousas avemos sempre de
fazer por as estimarmos e querermos como as nossas proprias, sobre o quall
stpreuemos mais largamente a Rui de sande caualeiro de nossa casa e alcaide moor de torres vedras
alguũas cousas que vos falara, Rogamos uos muy afectuosamente, praza uos dar lhe Inteira fe,
Muyto alto muyto
excelente e poderoso princepe e Irmaão nosso senhor
aIa vossa pessoa e Real
stado em sua santa guarda,
stprita em
torres vedras a iij dias de
mayo de 1493 ∙
El Rey»[25]
Obviamente
que os Reis Católicos se movimentaram de imediato, logo que souberam do
regresso de Colon pela carta do Almirante com as notícias de ter descoberto e
tomado posse, em nome dos seus soberanos, daquelas ilhas nas Índias. Na segunda
quinzena de Abril chegava o Almirante a Barcelona com os indígenas que tinha
recolhido, e era recebido triunfalmente.
A maior
autoridade na época era o Papa, quem decidia atribuir o direito de conquista e
cristianização nos territórios descobertos. O Papa Alexandre VI representava uma
vantagem adicional para os interesses dos Reis Católicos, pois tratava-se do
aragonês Rodrigo Borgia.
Por
coincidência, precisamente na mesma data em que D. João II dirigia aquela carta
ao Rei Fernando o Católico no dia 3 de Maio, a instâncias dos Reis Católicos o
Papa emitia a Bula Inter Coetera favorável a Castela e Aragão:
Data: 3
Maio 1493 [26]
Bula Inter
coetera
Emitente:
PAPA ALEXANDRE VI
De:
Vaticano, Roma
Destinatários;
Fernando e Isabel, Reis de Castela, Leão, Aragão, Sicília e Granada
«Alexander episcopus, servus servorum Dei,
carissimo in Christo filio Ferdinando regi et carissime in Christo filie
Helisabeth regine Castelle, Legionis, Aragonum, Sicilie et Granate illustribus,
salutem et apostolicam benedictionem. Inter cetera divine maiestati beneplacita
opera et cordis nostri desiderabilia illud profecto potissimum existit…
…sed
tandem, sicut Domino placuit, regno predicto [Granate] recuperato, volentes
desiderium vestrum adimplere, dilectum filium Christoforum Colon cum navigiis et hominibus ad similia instructis,
non sine maximis laboribus et periculis ac expensis destínastis, ut terras
remotas et incognitas huiusmodi per mare, ubi hactenus navigatum non fuerat,
diligenter inquirerent. qui tandem, divino auxilio, facta extrema diligentia,
per partes occidentales, ut dicitur, versus Indos in mari Oceano navigantes,
certas Ínsulas remotissimas et etiam terras firmas, que per alios hactenus
reperte non fuerant, invenerunt;…
…
sed de nostra mera liberalitate et ex certa scientia ac de apostolice
potestatis plenitudine, omnes et singulas terras et insulas predictas, sic
incognitas et hactenus per nuntios vestros repertas et reperiendas in posterum,
que sub dominio actuali temporali aliquorum dominorum christianorum constitute
non sint, auctoritate omnipotentís Dei nobis in beato Petro concessa ac
vicariatus Yhesu Christi, qua fungimur in terris, cum omnibus illarum dominiis,
civitatibus, castris, locis et villis, iuribusque et iurisdictionibus ac
pertinentiis universis, vobis heredibusque et successoribus vestris, Castelle
et Legionis regibus, in perpetuum, auctoritate apostolica, tenore presentium,
donamus, concedimus et assignamus, vosque ac heredes et successores prefatos de
illis investimus, illarumque dominos cum plena, libera et omnímoda potestate,
auctoritate et iurisdictione facimus, constituimus et deputamus;…
…
datum Rome, apud sanctum Petrum, anno incarnationis dominice MCCCCLXXXXIII,
quinto nonas maii, pontificatus nostri anno primo.»
A
Bula Inter Coetera dirigia-se especificamente aos Reis Fernando e Isabel de
Castela, Leão, Aragão, Sicília e Granada descrevendo que após a recuperação do
reino de Granada, com a graça de Deus e a vontade dos Reis, o dilecto filho Christoforum Colon com homens e navios,
enfrentando grandes trabalhos e expondo-se a enormes perigos, navegando por
mares anteriormente não navegados tentaram averiguar a existência de terras
remotas e desconhecidas. E com o auxílio divino, navegando no mar Oceano em
direcção às Índias nas partes ocidentais, descobriram certas ilhas e terras
firmes que outros até então desconheciam.
O
Papa, na plenitude do seu poder apostólico doa, concede e atribui aos Reis de
Castela e Aragão, perpetuamente e depois aos seus herdeiros e sucessores o
poder apostólico, direitos e jurisdição em todos os domínios, cidades,
castelos, vilas e aldeias naquelas ilhas e terras firmes, descobertas e a
descobrir…
Note-se
que o nome próprio do navegador foi latinizado mas se manteve o seu apelido
Colon.
Esta
Bula contribuía para estabelecer um forte clima de tensão entre Portugal e os
Reinos de Espanha, já preparado por D. João II quando comunicou a Colon que
aquelas terras descobertas lhe pertenciam e se oficializou com a carta que o
Rei de Portugal enviou a Fernando de Aragão no mesmo dia em que era emitida a
Bula. Nessa carta, D. João II alertava já que ia enviar como embaixador Rui de
Sande com mais desenvolvidos argumentos sobre as pretensões portuguesas.
Assim,
com data do dia seguinte, 4 de Maio, mas considerada como tendo sido
antedatada, o Vaticano expedia nova Bula, também denominada Inter Coetera, que
repetia o essencial da Bula anterior mas estabelecia agora uma linha divisória,
de polo a polo, a cem léguas dos Açores e de Cabo Verde, para ocidente e sul
(sic) da qual se concediam os já referidos direitos aos Reis Católicos.
Data: 4
Maio 1493 [27]
Bula Inter
coetera (II)
Emitente:
PAPA ALEXANDRE VI
De:
Vaticano, Roma
Destinatários;
Fernando e Isabel, Reis de Castela, Leão, Aragão, Sicília e Granada
«Alexander episcopus,…
…,
dilectum filium Christoforum Colon,
…
…
sed de nostra liberalitate et ex certa scientia ac de apostolic potestatis
plenitude, omnes insulas et terras firmas inventas et inveniendas, detectas et
detegendas, versus occidentem et meridiem, fabricando et constituindo unam
lineam a polo artico, scilicet septemtrione, ad polum antarticum, scilicet
meridiem, sive terra firme et insule invente et inveniende sint versus Indiam
aut versus aliam quamcumque partem: que linea distet a qualibet insularum que
vulgariter nuncupantur de los Azores et Caboverde centum leucis versus
occidentem et meridiem, ita quod omnes insule et terre firme reperte et
reperiende, detecte et detegende, a prefata linea versus occidentem et meridiem
per alium regem aut principem christianum non fuerint actualiter possesse usque
ad diem nativitatis domini nostri Yhesu Christi proxime preteritum, a quo
incipit annus presens MCCCCLXXXX tertius, quando fuerint per nuntios et
capitaneos vestros invente alique predictarum insularum, …
…
datum Rome, apud sanctum Petrum, anno incarnationis dominice MCCCCLXXXXIII,
quarto nonas maii, pontificatus nostri anno primo. »
Tratava-se
já, obviamente, de uma tentativa dos Reis Católicos para contornar as
pretensões portuguesas sustentadas pelo Tratado de Alcáçovas-Toledo, que
atribuía a Portugal o direito à navegação e conquista para sul das Canárias,
‘contra Guiné’, ou seja no mar Oceano desde a costa africana. Daí provavelmente
a inadequada expressão “para ocidente e sul da linha divisória de polo a polo”
inscrita na Bula.
Não
se tratava, no entanto, de uma ideia original dos Reis Católicos, pois numa
carta que enviaram a Colon se dizia que tinha sido o Almirante a indicar que se
fizesse a divisão por aquela linha.
Em
sequência da Bula Papal que favorecia as suas pretensões, os Reis Católicos
enviaram um emissário a Portugal para requerer que D. João II mandasse apregoar
pelo reino que nenhuma caravela deveria navegar para as terras achadas pelo
Almirante.
Ao
que D. João II respondeu, por carta de 23 de Maio, dizendo que enviaria o seu
emissário negociar com os Reis Católicos para que se resolvessem as
divergências e fosse possível ‘tomar assento’, ou seja estabelecer acordo entre
os Reinos. Acrescentando que entretanto suspenderia por dois meses o envio de
navios portugueses àquelas partes.
Nesta
carta D. João II referiu-se ao Almirante pelo nome de Cristovam Colombo, ou seja, divergia do nome do descobridor
inscrito na Bula que dava origem ao conflito latente e divergia do nome pelo
qual o Almirante era conhecido nos Reinos de Espanha.
Este
facto suscita a questão de saber se teria sido aquele o nome do navegador em
Portugal, ou se D. João II se limitava a repetir o nome que já figurava nas
edições impressas da carta a Santangel ou se, na realidade, era o
aproveitamento estratégico conveniente para afastar dos Reis Católicos a ideia
de que o Almirante não lhes era inteiramente leal e tinha vindo a Portugal
propositadamente relatar que as ilhas descobertas se encontravam a sul do
paralelo das Canárias, e portanto na zona portuguesa do Tratado de Alcáçovas em
vigor.
Data: 23
Maio 1493 [28]
Remetente:
D. JOÃO II, REI DE PORTUGAL
De: Torres
Vedras
Destinatário:
D. Fernando, Rei de Aragão e Castela
Em:
Barcelona
«Ao muyto alto muyto excelente e poderosso princepe El Rey de castella d’aragam de sezilia de graada etc nosso muyto amado e preçado Irmaão.,
Muyto
alto muyto exçellente e poderoso princepe Irmaão Nos dom Ioham per graça de
deus Rey de portugal e dos algarues d aaquem e d aallem mar em africa e senhor
de guinee vos enuiamos muyto saudar como aquelle que muyto amamos e preçamos
.,
per elycius [sic] de Fyrreira vosso contino
Recebemos huũa vossa carta de creença ., e ouuimos alguũas cousas que da vossa
parte per vertude della nos disse , E quanto aos pregões e defesa que nos
enuiaaes Requerer e que mandemos dar pera que nenhuũas carauellas e nauios de
nossos Reynos e fora delles , nom vaão ao que ora nouamente achou dom christouam colombo vosso almirante .,
se o dicto elycus [sic] de Fyrreira trouuera poder pera em vosso Nome fazer dar
outros semelhantes em vossos Reynos e portos delles verdaderamente com muy boa
vontade folgaramos de ho fazer por alguũ tempo , asy longuo e conuinhauel , em
que se antre Nos podia bem assentar e lymitar os mares ylhas e terras vossas e
Nossas porque doutra maneira pareçia que os dictos pregões se nom podiam bem
dar sem sse seguirem disso alguũs Inconuenientes.Mas porque o dicto lopo de
ferreira nos disse que nom trazia , o dicto vosso poder ., E sabendo que em
Nossos Reynos se nom podem armar e abitalhar nauios de nossos naturaaes e
estrangeiros , que com a aIuda de deus , Nos ho nom toruemos , o que asy
faremos muy Inteiramente , ouuemos por bem de sobresseer nysso atee primeiro ,
per pessoas nossas que loguo a vos enuiamos com Nosso poder abastante se tomar
nello çerto assento porque entonçes saberemos bem os pregoes e defesa que de
huũa parte e da outra se ham de dar , e asy o que a vos e a nos pode pertençer
.,
E posto que teuessemos ordenados alguũs nauios
que fossem descobrir muy alongados do que tinha descuberto o dicto almirante e
mandassemos a Nossos capitaães e gentes do mar que asy ho fezessem e comprissem
, pero por nom pareçer , enuiando Nos os dictos nauios em tal tempo, que antre
Nos que tanto uos amamos , avia alguũa deferença o que nosso Senhor nom queira
quisemos e nos praz de mandar sobresseer os dictos nauios que asy tinhamos
prestes por dous meses despois da chegada das dictas nossas pessoas a vos ,
porque no dicto tempo se pode com a aIuda de deus em todo tomar tall assento ,
com que muy çerto se saiba onde vossos Nauios e nossos deuem e podem hir
.,
E esperamos em nosso Senhor que estas cousas
se façom asy bem e com tanto prazer e acordo de todos que a paz , amjzade ,
Irmyndade e grande amor que antre Nos ha nom mingue , antes sse acreçente muyto
mais e se conserue pera sempre ,
E o dicto lopo de ferreira com quem fallamos
vos podera dizer que sentio de nossa vontade ser asy Inteira e boa ., como pera
verdadeiro Irmaão que muyto amamos ,
Muyto alto muyto exçellente e poderoso
prinçepe Irmaão ., Nosso Senhor aIa sempre vossa pessoa e Reall estado em sua
santa guarda
stprita em torres vedras a xxiij dyas de mayo
de 1493 •
a) El Rey»[29]
***
Enquanto
decorria esta situação de conflitualidade entre os Reinos Ibéricos continuava a
propagação das notícias sobre as ilhas encontradas pelos navios castelhanos no
Ocidente.
E,
em 10 de Maio, Giacommo Trotti enviava nova missiva ao seu senhor, o Duque de
Ferrara. Para Trotti, que antes tinha enviado ao Duque a cópia da carta da
Annibale Zennaro onde se designava o Almirante por Colomba / Collomba, esse
Colomba, com quem ele não tinha contactado nem conhecia, seria um espanhol, ou
pelo menos assim o designava nesta nova carta:
Data: 10
Maio 1493 [30]
Remetente:
GIACOMO TROTTI
De: Milão
Destinatário:
Ercole, Duque de Ferrara
Em: Ferrara
«Al
mio illustrissimo signore il signore duca de Ferrara &c.
Scripssi a'dì passati a la vostra excellentia de
quelle insole extranee trovate per quel
Spagnolo, navicando, et li mandai la copia de una littera la quale me
respondete che, se intendeva altro, gli ne desse adviso,…
Mediolani,
.x. mai .1493.
Excellentie
vestre servus
Iacobus
Trottus.»
«Ao meu ilustríssimo
senhor, O Senhor Duque de Ferrara,
Escrevi há uns dias a
Vossa Excelência sobre aquelas ilhas estranhas encontradas por aquele Espanhol, navegando, e lhe
enviei cópia de uma carta, sobre o que me respondeu que se eu soubesse de mais
alguma coisa disso o avisasse, …
Milão 10 de Maio de 1493
Servidor de vossa
excelência
Giacommo Trotti»
Também
Pietro Martire, que tinha acompanhado o embaixador de Castela na Santa Sé,
quando este regressou ao seu país em 1487, e ficara depois a leccionar em
Salamanca era, nesta data do regresso de Colon, o capelão dos Reis Católicos, e
escreveu ao seu protector Conde de Arona, dando conta do regresso do Almirante.
Sem sequer o conhecer, como demonstra a expressão que utilizou para o
mencionar, Pietro Martire decidiu chamar-lhe homem lígure [31],
estabelecendo de alguma forma uma ligação à sua própria região natal na
‘Itália’, apesar de manter latinizado para Colonus o apelido Colon, sem o
deturpar para Columbo:
Data:
14 Maio 1493 [32]
Remetente:
PIETRO MARTIRE D’ANGHIERA
De:
Barcelona
Destinatário:
Giovanni Borromeo, Conde de Arona e Angera
Em:
Arona
«rediit ab Antipodibus occiduis Christophorus quidam
Colonus vir ligur, qui a meis regibus ad hanc provinciam triavix
impetraverat navigia, quia fabulosa, que dicebat, arbitrabantur...»
«Regressou
das Antípodas ocidentais um tal Cristoforo
Colonus, homem lígure, que obteve dos meus reis três navios para visitar
essas províncias, com muita dificuldade, na verdade, porque o que relatou foi
tomado como sendo uma fábula»[33]
Pietro
Martire produziu não apenas esta carta de Maio 1493 mas muitas mais até ao ano
1525, que foram depois reunidas nas publicações Opus Epistolarum e De Orbe
Novo. Em 13 Setembro 1493 escreveu ao Conde de Tendilla e ao Arcebispo de
Granada, no mesmo dia ao Cardeal Ascanio Sforza e em 1 de Outubro ao Arcebispo
de Braga, todas elas relatando a chegada de Colonus. As cartas posteriores, já nos anos subsequentes, não
abordaram a novidade da descoberta, mas continuaram a referir o Almirante,
sempre designado como Colonus.
A
tensão entre os dois Reinos Ibéricos não passava despercebida aos olhos e
ouvidos dos representantes de outros governantes e poderosos, e era agora
também tema de informação valiosa conjuntamente com as notícias sobre as
descobertas, como consta na carta do agente do Duque de Milão em Bolonha:
Data: 17
Junho 1493 [34]
Remetente:
FRANCESCO TRANCHEDINI
De: Bolonha
Destinatário:
Duque de Milão
Em: Milão
«Illustrissimo principi et excellentissimo domino domino meo
observandissimo domino duci Mediolani.
Illustrissimo principe
et .excellentissimo signore mio . . . . . Essendo retornato il barbero alleno(2)
del magnifico messer Zoanne de verso Spagna con sei o sette zannetti, quali ha
conducti, referisce che quello serenissimo et inclito re haviva preparata et in
ponto una grossissima armata, quale era in ordine ad potere far vela … et per
questa casone affirma epso barbero ch'el prefato re de Spagna remandava Columbo suo capitano a quella impresa
con parechie charavelle e doe nave grosse et cum molta quantità di tele et
altri panni, …
Ex Bononia, .xvii. iunii .1493.
Fidelissimus servus
Franciscus Tranchedinus.»
«Ilustríssimo principe e excelentíssimo senhor … Duque de Milão …
Tendo regressado de Espanha o treinador de cavalos do magnífico Senhor
Giovanni, com seis ou sete ginetes, refere que aquele sereníssimo e ínclito Rei
tinha preparada e pronta una enorme armada, a qual estava em ordem para partir
… e nesta ocasião afirma o mesmo treinador que o mencionado Rei de Espanha
reenviava Columbo seu capitão àquela empresa com várias caravelas e duas
grandes naus e com muita quantidade de tecidos e outros panos…
De Bolonha, 17 de Junho de 1493
Fidelíssimo servidor
Francesco Tranchedini»
A
difusão, a partir de Roma, da tradução para latim da carta do Almirante a
Santangel, adendada com o epigrama do
Bispo de Montepeloso que deturpou o nome para Columbo, começara a produzir
efeitos.
Como
tal, a divulgação em grande escala dos impressos pela Europa substituiu a
função desempenhada pelos diversos agentes das grandes casas até que se
produziram novos acontecimentos. Durante vários meses após essas primeiras
cartas foram as edições impressas que desempenharam o valioso papel que convinha
tanto aos Reis Católicos como a Christóval Colon.
Só
em Março do ano seguinte voltaram a circular as cartas endereçadas, agora com
notícias sobre o regresso de parte da frota que tinha partido com o Almirante
para a segunda viagem e com os primeiros relatos sobre esta.
Data: 19
Março 1494 [35]
Remetente:
GIAMBATTISTA STROZZI
De: Cádiz
Destinatário:
Duquesa de Mântua (?)
Em: Mântua
«Copia
de una littera havuta da Calis a li .XVIIII. de marzo .1494.
A dì .vii. de questo arivorono qui a salvamento
.XII. caravelle venute dalle nuove isole trovate per Colonbo savonese, armiraglio del Oceano per lo re de Castiglia,
venute in di .xxv. dalle ditte isole d'Anteglia … arivorono qui sopra a Calis
…senza mai descoprire altra terra, sono segnate ditte isole più de .XLIII., gradi .XXVI. in gradi .XXXI.
sotto l'equinotio. …
Hanno
portato horo circa ducati .30. mila, secondo dicono; canella assai, ma bianca
come gengero mechino; pepe in bacelli come fava dirucata, fortissimo, ma non
con sustantia come quello da Levante; legni dicono esser sandali, ma bianchi;
pappagalli come falconi et rossi come fagiani. …. quest'altro viagio se saperà
tutto.
Giovanbatista
Strozi, in Calis.»
«Cópia de uma carta recebida de Cádiz,
de 19 de Março de 1494
No dia 7 deste mês chegaram aqui a
salvo 12 caravelas vindas das novas ilhas encontradas por Colonbo savonês, Almirante do Oceano pelo Rei de Castela, demorando
25 dias desde as ditas ilhas de Antilha,… chegaram aqui a Cádiz … sem terem ido
à descoberta de outras terras, e assinalaram mais de 43 ilhas entre os 26 e os
31 graus abaixo do equinócio….
Trouxeram cerca de 30 mil ducados em
ouro, segundo dizem, muita canela, mas branca como o gengibre, pimenta em vagem
como as favas secas, fortíssima mas não com substância como aquela do Levante;
madeira que dizem ser sândalo, mas branca; papagaios como falcões e vermelhos
como faisões…. Desta outra viagem se saberá tudo.
Gianbattista Strozi, em Cádiz»
O epigrama
do Bispo de Montepeloso adulterando o nome do descobridor começara a produzir
efeitos, tal como produzia efeitos a origem logo apontada por Pietro Martir
d’Anghiera. No espaço de um ano o navegador Christóval Colon era transformado
num Colombo de Savona.
Data: 11
Junho 1494 [36]
Remetente:
MORELLETTO PONZONE
De: Ferrara
Destinatário:
Isabella, Duquesa de Mântua
Em: Mântua
«A
la mia illustrissima madonna marchisana de Mantua, in Mantua.
A lo fato de Spagna, novamente uno chiamato Columbo si à trovato una certa isola
per lo re de Spagna, in la quale ge sono homini de statura nostra, ma sono
beretinazi (2) et ànno lo naso como simia; et lo primo de loro si à
atachato in lo naso uno pezo de oro che gie copri la bocha … et le donne ànno
la faza larga como una rutella, e tuti vano nudi, homini e donne;…
Data
in Ferara, adì .11. zugno .1494.
Moreleto
Ponzone de Cremona servitore.»
«À minha ilustríssima
senhora marquesa de Mântua, em Mântua.
Sobre as coisas de
Espanha, novamente um chamado Columbo
encontrou uma certa ilha para o Rei d Espanha, na qual há homens com a nossa
estatura, mas de cor parda avermelhada e têm o nariz como símios; e o primeiro
deles tinha preso ao nariz um pedaço de ouro que lhe cobre a boca … e as
mulheres têm a cara larga, arredondada, e todos andam nús, homens e mulheres
Escrita em Ferrara, dia
11 de Junho de 1494
Moreleto Ponzone de
Cremona, vosso servidor»
Durante
os dois anos seguintes não foram conhecidas novas cartas que se referissem ao
Almirante, porque este estava então na sua segunda viagem para Ocidente. Mas a
notícia do regresso voltou a ser remetida para as Repúblicas italianas,
iniciada pelo chanceler do embaixador do Duque de Milão em Castela.
Data: 23
Junho 1496 [37]
Remetente:
FRANCESCO LITTA
De: Almazán
Destinatário:
Duque de Milão
Em: Milão
«El Colombo capitanio di queste
maestá, quale discoperse le insule et parti per tornare in quelle, quando sue
alteze stavano in Barzalona, che sonó cercha anni tri, é ritornato et
dismontato in Cálice, et, per quello se dice, porta bona quantitá de oro, del
quale ha trovato una vena, alia gionta sua qui se intenderá meglio la veritá,
de la quale ne avisaró poi piü particularmente la signoria vostra.
Ex
Almazano, die .23. iunii .1496.
Illustrissime
dominationis vestre fidelissimus servus
Franciscus
Litta.»
«O Colombo capitão destas Majestades, que descobriu as ilhas e partiu
para tornar a elas quando suas Altezas estavam em Barcelona, há cerca de três
anos, regressou e desembarcou em Cádiz e por aquilo que se diz traz boa
quantidade de ouro, de que encontrou um veio, sobre o que se saberá melhor a
verdade, da qual avisarei depois particularmente vossa senhoria.
De Almazan, 23 de Junho de 1496
Vosso fidelíssimo servidor do
ilustríssimo senhor
Francesco Litta»
Data: 23
Junho 1496 [38]
Remetente:
ANTONIO COSTABILI
De: Milão
Destinatário:
Duque Ercole I de Ferrara
Em: Ferrara
«Avisi
venuti de Hyspania,
Che Collono, capitaneo de
l’armata hyspana, quale scoperse le insule trovate li anni proximi passati, era
arrivato a Cales, et ha portato gran quantitate de oro, del quale ne ha trovato
una vena …»
«Aviso vindo de
Hispânia,[39]
Que Collono, capitão da armada hispana, que descobriu as ilhas
encontradas nos anos próximos passados, tinha chegado a Cádiz, e trouxe grande
quantidade de ouro, do qual encontrou um veio …»
***
O elucidativo
silêncio da nação genovesa
Tendo
então circulado nos Estados Italianos quer as correspondências pessoais (em
Roma Florença, Ferrara, Milão, Mântua, Bolonha e Arona), quer os impressos da
carta de Colon a Santangel (em Roma, Florença e Pavia), é notória uma ausência
de muito peso: Génova!
Será
que o descobrimento do Novo Mundo não foi merecedor de ser divulgado na
República genovesa nem houve interesse desta em imprimir uma edição da carta?
Principalmente atendendo ao facto de Pietro Martire ter classificado o
Almirante como lígure e de Giambattista Strozzi lhe ter chamado savonês?
Tão mais comprometedora é a ausência de Génova na
extensa lista porque na Historie a
sua chegada a Portugal está relatada desta forma:
«Ma essendo
l'Ammiraglio grandissimo nuotatore, e vedendosi due leghe o poco più discosto
da terra, prendendo un remo che la sorte gli presentò, e aiutandosi con quello
talvolta, e talaltra nuotando, piacque a Dio, che per altra maggior cosa
l'aveva salvato, di dargli forze onde giungesse a terra, benché tanto stanco e
travagliato dalla umidità dell'acqua che stette molti dì a rifarsi. E poiché non
era lontano da Lisbona, dove sapeva che si ritrovavano molti della sua nazione
genovese, più presto che potè si trasferì quivi dove, essendo conosciuto da
loro, gli fu fatta tanta cortesia e sì buona accoglienza che mise casa in
quella città e tolse moglie.» [40]
«Mas sendo o Almirante
grande nadador, e vendo-se a duas léguas ou pouco mais distante de terra,
tomando um remo que a sorte lhe apresentou, e ajudando-se com aquele umas
vezes, e outras vezes nadando, graças a Deus que para um destino maior o salvou
ao dar-lhe força para alcançar terra, apesar de muito cansado e tolhido pela
humidade da água que demorou bastantes dias a recompor-se. E porque não estava
longe d Lisboa, onde sabia que se encontravam muitos da sua nação genovesa, o
mais cedo que conseguiu transferiu-se para aqui onde, sendo conhecido dles, lhe
foi feita tanta cortesia e tão bom acolhimento que pôs casa naquela cidade e
tomou mulher»
Portanto,
o Colombo que se salvou nadando duas léguas em 1476 no Cabo de S. Vicente,
dirigiu-se para Lisboa, onde havia uma grande comunidade genovesa, que o
acolheu muito bem.
Pela
história oficial seria esse mesmo Colombo genovês quem chegou mais uma vez a
Lisboa, mas agora já como Almirante do Mar Oceano e Vice-Rei das Índias,
regressado da viagem de descobrimento e conquista que acabara de fazer.
Pois
a sua chegada não passou despercebida e infinitíssima gente foi ver os
recém-chegados.
Foi,
sem dúvida, o grande acontecimento daqueles anos finais do século XV.
«Miércoles, 6 de marzo
Sabido cómo el
Almirante venía de las Indias, hoy vino tanta gente a verlo y a ver los indios,
de la ciudad de Lisboa, que era cosa de admiración, y las maravillas que todos
hacían, dando gracias a Nuestro Señor y diciendo que, por la gran fe que los
Reyes de Castilla tenían y deseo de servir a Dios, que Su Alta Majestad los
daba todo esto.» [41]
«Quarta-feira, 6 de Março
Sabendo-se que o Almirante vinha das
Índias, hoje veio tanta gente da cidade de Lisboa, para vê-lo e para ver os
índios que era coisa de admirar, e como todos estavam maravilhados, dando
graças a Nosso Senhor e dizendo que, pela grande fé que os Reis de Castela
tinham e o desejo de servir a Deus, que sua Alta Majestade lhes dava tudo isto.»
«Jueves, 7 de marzo
Hoy vino
infinitísima gente a la carabela y muchos caballeros, y entre ellos los
hacedores del Rey, y todos daban infinitísimas gracias a Nuestro Señor por
tanto bien y acrecentamiento de la Cristiandad que Nuestro Señor había dado a
los Reyes de Castilla, el cual dice que apropiaban porque Sus Altezas se
trabajaban y ejercitaban en el acrecentamiento de la religión de Cristo.» [42]
«Quinta-feira,
7 de Março
Hoje veio
infinitíssima gente à caravela e muitos cavaleiros, e entre eles os servidores
do Rei, e todos davam infinitíssimas graças a Nosso Senhor por tanto bem e
acrescentamento da Cristandade que Nosso Senhor tinha dado aos Reis de Castela,
o que dizem ser apropriado porque Suas Altezas trabalhavam e exercitavam no
engrandecimento da religião de Cristo»
Ninguém
da grande comunidade genovesa em Lisboa, a mesma que acolheu Colombo quando ele
cá chegou em 1476, se apercebeu do facto?
Nenhum
dos seus certamente inúmeros amigos e conhecidos genoveses tomou a iniciativa
de escrever ao Doge ou ao Conselho Aristocrático da República de Génova
enaltecendo o enorme feito daquele seu compatriota que agora subia aos píncaros
da fama?
E
quando o Almirante se apresentou numa entrada triunfal em Barcelona, recebido
apoteoticamente pelo povo e com grande pompa na Corte, nenhum delegado ou
representante teve interesse em enviar a notícia para algum grande mercador
genovês?
Acontece
que em 1493, quando o Almirante colocou Barcelona em delírio, encontravam-se na
Corte Aragonesa dois embaixadores da República de Génova, Francesco Marchesio e
Giovanni Antonio Grimaldo que não puderam deixar de assistar aos acontecimentos
daqueles dias.
Pois
nos arquivos de Génova não se encontrou nenhuma correspondência sua a relatar o
feito do conterrâneo que certamente entusiasmaria todo o povo genovês.
Bartolomeu
Senarega, chanceler da República, produziu um manuscrito descrevendo os
acontecimentos no período de 1488 a 1514, o qual foi incluído na colecção “Rerum Italicarum Scriptores” publicada
por Ludovico Muratori já no século XVIII. O texto de Senarega “Genuensis
de rebus genuensibus commentaria ab anno MCDLXXXVIII usque ad annum MDXIV” está incluído no Tomo XXIV,
editado em 1738:
«Anno MCCCCXCIII
…
Redierunt per id tempus Franciscus Marchesius Jureconsultus,
vir doctissimus, & Joannes Antonius Grimaldus, ambo viri providi, & de
sua Patria bebemeriti, Oratores nostri ex Hispania, pace cum illis Regibus
honestis conditionibus firmatâ. …
Ii etiam affirmaverunt, vera esse, quae de Insulis nuper
repertis à Christophoro Columbu Genuensi dicta feruntur. …
Christophorus, & Bartholomaeus Columbi fratres Genuae
plebejis parentibus ott, & lanificii mercede victitarunt. …
Sed Bartholomaeus minor natu in Lusitania demum Ulissipone
constitit, ubi intentus quaestui, tabellis pingendis operam dedit. …» [43]
«Ano 1493
…
Regressaram por esse tempo Francesco
Marchesio, ilustre jurisconsulto e Giovanni António Grimaldo, ambos homens
eminentes e Embaixadores da Pátria ante os Reis de Espanha, com quem tinham
firmado uma paz conveniente. Eles asseguraram como coisa certa o encontro feito
pelo genovês Cristoforo Colombo de ilhas não conhecidas.
Os irmãos Cristoforo e Bartolomeu
Colombo, genoveses de modesta ascendência e que viviam do comércio da lã. …
…
Bartolomeu, o mais novo,
dirigiu-se a Portugal e por fim estabeleceu-se em Lisboa…»[44]
É
Senarega quem escreve, já depois de 1514, que os embaixadores relataram em
Génova, quando regressaram em 1493, os acontecimentos protagonizados por
Colombo.
Mas
em Génova não houve nenhuma reacção!
Nem
sequer uns meses depois do regresso dos embaixadores, que aconteceu após 5 de
Agosto, data em que assinaram um Tratado de comércio com os Reis Católicos. Em
4 de Outubro a Senhoria de Génova escreve aos Reis Fernando e Isabel anunciando
a chegada dos embaixadores. Pois nessa carta não há nenhuma alusão ao que
deveria ser grande motivo de orgulho para os genoveses, o de ter sido o
compatriota Colombo o presumível herói da descoberta e conquista efectuada no
Oceano:
«Deerat
rebus tam preclaris ab ipsis [Maiestatibus vestris] gestis et studio in
subditos, pace domi parta, purgato regno, subiecta ea Betice parte frustra
alias a prioribus regibus tentata, quam Barbari, post Vandalorum incursionem,
unde illi regioni nomen indictum est, per tot annis oceuparunt, perquisitis peniti'ssimis
Oceani regionibus antehac ómnibus, ipsis etiam Romanis rerum dominis, ignotis,
ut qui Aragonensi imperio subditi sunt, ipsi quoque nobiscum quieta pace frui
possent. » [45]
É assim bastante elucidativo o silêncio e o alheamento da
República de Génova face ao protagonismo do seu alegado cidadão no
importantíssimo acontecimento e a conclusão é inevitável:
Não havia qualquer ligação ou relação entre o Almirante
Christóval Colon e Génova.
APÊNDICE:
Diagramas de
fluxo dos impressos da carta a Santángel e da correspondência enviada
anunciando o regresso de Colon.
FONTES
DOCUMENTAIS
Archivo
General de Simancas:
Carta de Cristóbal Colon a Luis de
Santángel, Escribano de Ración de sus Majestades, dando cuenta de su primer
viaje a las Indias
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Archivo
Histórico de la Nobleza:
Carta misiva de Juan
II de Portugal a Fernando el Católico por la que le comunica la llegada de
Cristóbal Colón al puerto de Lisboa, y que … http://pares.mcu.es/ParesBusquedas20/catalogo/description/12902084?nm
Carta misiva de Juan II de Portugal a Fernando el
Católico por la que acepta paralizar las salidas de carabelas a descubrir
" donde Cristóbal …
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BIBLIOGRAFIA RELEVANTE
BERCHET,
Guglielmo - Fonti italiane per la storia
della scoperta dl Nuovo Mondo, in Raccolta
di Documenti e Studi – Publicati dalla R. Comissione Colombiana – pel
Quarto Centenario dalla Scoperta dall’America, Parte III, Vol. I, Roma:
MDCCCXCVI.
COLÓN, Cristóbal - Diario de a bordo. Edición de Luis
Arranz. Madrid: Editorial EDAF, 2006.
COLÓN,
Hernando - Historie del S.D.FERNANDO
COLOMBO; Nelle quali s'ha particolare, et vera relatione della vita, et de'
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ch'egli fece delle Indie Occidentali, dette Nuovo Mondo, hora possedute dal
Sereniss. Re Catolico: Venetia, MDLXXI
DÁVILA, Maria Barreto – A mulher dos descobrimentos, D. Beatriz
Infanta de Portugal. Lisboa: A Esfera dos Livros, 2019.
GONZÁLEZ CRUZ, David – Cristóbal Colon y la campaña propagandística
del descubrimiento de América, in Versiones,
propaganda y repercussiones del Descubrimiento de América. Madrid: Silex Ediciones, 2016
LOLLIS,
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in Raccolta di Documenti e Studi –
Publicati dalla R. Comissione Colombiana – pel Quarto Centenario dalla Scoperta
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PENNESE, Giuseppe – Pietro Martire d’Anghiera e le sue relazioni
sulle scoperte oceaniche, in Raccolta
di Documenti e Studi – Publicati dalla R. Comissione Colombiana – pel
Quarto Centenario dalla Scoperta dall’America, Parte V, Vol. II, Roma:
MDCCCXCVI.
PIEPER, Renate – Los ecos de los primeiros viajes de descubrimiento en el Sacro Império,
in GONZÁLEZ CRUZ, David - Versiones,
propaganda y repercussiones del Descubrimiento de América. Madrid: Silex Ediciones, 2016.
RUZZIN,
Valentina – Tante cose se dicono que
pareno incredebele – Lettera sulla scoperta dell’America. Atti della
Società Ligure de Storia Patria, nº LVI. Génova: 2016
SENAREGA,
Bartolomeo - “Genuensis de
rebus genuensibus commentaria ab anno MCDLXXXVIII usque ad annum MDXIV” .
Rerum Italicarum Scriptores, Tomo XXIV, Milão: Ed.Ludovico Muratori, Ex
Tipographia Societatis Palatinae in Regia Curia. 1738
[1] O Autor escreve em conformidade com a
ortografia que não avilta as raízes etimológicas da língua portuguesa.
[2] COLÓN, Cristóbal - Diario de a bordo. Edición de Luis
Arranz. Madrid: Editorial EDAF, 2006.
[3] Tradução livre, pelo Autor, de todos
os originais em castelhano incluídos no texto.
[4] Na transcrição que reproduzimos,
publicada na Raccolta, consta a data de 4 de Março, mas no documento
paleográfico do Archivo de Simancas (EST, LEG, 1,2,1,164) pode ler-se a data de
xiiij de marzo. Neste dia 14 de Março foi quando o Almirante partiu de Lisboa
para Castela. Ver Imagem 1.
[5] Vários autores chamam Rafael Sanchez
ao tesoureiro de Aragão, provavelmente induzidos em erro pelo nome atribuído na
tradução desta carta para latim. Gabriel é o nome nos documentos dos Archivos
de España.
[6] LOLLIS, Cesare de - Scritti di Cristoforo Colombo, in Raccolta
di Documenti e Studi
– Publicati dalla R. Comissione Colombiana – pel Quarto Centenario dalla
Scoperta dall’America, Parte I -Vol. I. Roma: MDCCCXCVI. Págs.120-135
Sobre
a data do documento ver nota 4.
[7] Sobre a data do documento veja-se a
nota 4 e a Imagem 1.
[8] Note-se que este documento arquivado
em Simancas não está assinado por Colon, devendo ser uma cópia.
[9] GONZÁLEZ CRUZ, David – Cristóbal Colon y la campaña propagandística
del descubrimiento de América, in Versiones,
propaganda y repercussiones del Descubrimiento de América. Madrid: Silex Ediciones, 2016. Págs 21-64.
[10] No calendário romano, ‘tertio
kalendas maii’ designava o terceiro dia contando regressivamente desde o
primeiro dia (kalendas) de Maio. Corresponde, portanto, a 29 de Abril.
[11] Esta data na tradução latina, segue o
calendário romano, em que ‘pridie idus Martii’ corresponde à data legível no
documento paleográfico, 14 de Março.
[12] Tradução livre e simplificada, pelo
autor, a partir da versão castelhana, in NAVARRETE, Martin Fernandez de – Coleccion de los viajes y descubrimientos
que hicieran por mar los españoles. Tomo I. Segunda edición. Madrid:
Imprenta Nacional, 1853. Págs.314-345
[13] PIEPER, Renate – Los ecos de los primeiros viajes de descubrimiento en el Sacro Império,
in GONZÁLEZ CRUZ, David - Versiones,
propaganda y repercussiones del Descubrimiento de América. Madrid: Silex Ediciones, 2016. Págs 145-160.
[14] RUZZIN, Valentina – Tante cose se dicono que pareno incredebele
– Lettera sulla scoperta dell’America. Atti
della
Società Ligure de Storia Patria, nº LVI. Génova: 2016. Págs 329-343
[15] BERCHET, Guglielmo –
Fonti italiane per la storia della
scoperta dl Nuovo Mondo, in Raccolta
di Documenti e Studi – Publicati dalla R. Comissione Colombiana – pel
Quarto Centenario dalla Scoperta dall’America, Parte III -Vol. I. Roma: MDCCCXCVI. Págs.141-142
[16] A data de 9 de Março está obviamente
errada, como reconhecido até por Henry Harisse. Face a todos os
dados conhecidos será 9 de Abril. Mesmo que Colon tivesse
escrito a sua carta em Lisboa no dia 4 de Março
não haveria tempo suficiente para chegar a Barcelona, a
Corte decidir divulgá-la, Aniballe Zennaro tomar
conhecimento e escrever para Milão.
[17] Ver nota 15.
[18] Tradução livre, pelo Autor, de todos
os originais em italiano, inseridos no texto.
[19] BERCHET, Guglielmo –
Op. cit. Pág.141.
[20] BERCHET, Guglielmo –
Op. cit. Pág.165.
[21] BERCHET, Guglielmo –
Op. cit. Pág.144.
[22] COLÓN, Cristóbal - Diario
de a bordo. Edición de Luis Arranz. Madrid:
Editorial EDAF, 2006.
[23] Os membros da família real portuguesa
e também os descendentes de D. Nuno Álvares Pereira não usavam apelido, cf.
DÁVILA, Maria Barreto – A mulher dos
descobrimentos, D. Beatriz Infanta de Portugal. Lisboa: A Esfera dos
Livros, 2019. Pág. 18.
[24] Archivo
Histórico de la Nobleza, VILLAGONZALO,CP.553,D.10
[25] Transcrição de Pedro Pinto, Centro de Estudos Históricos,
Universidade NOVA de Lisboa, CHAM – Centro de Humanidades, FCSH, Universidade
NOVA de Lisboa, Universidade dos Açores, in ph-colombina.blogspot.com,
15/06/2019
[26] BERCHET, Guglielmo – Op. cit.. Pág.5.
[27] BERCHET, Guglielmo –
Op. cit. Pág.8.
[28] Archivo Histórico de la Nobleza, VILLAGONZALO,CP.553,D.10
[29] Transcrição de Pedro Pinto, Centro de Estudos Históricos,
Universidade NOVA de Lisboa, CHAM – Centro de Humanidades, FCSH, Universidade
NOVA de Lisboa, Universidade dos Açores, in Geneall Forum.
https://geneall.net/pt/forum/186820/duas-cartas-de-d-joao-ii-ao-rei-de-castela-e-aragao-em-1493-achado-arquivistico-mas-noticia-com-d/#a415717
[30] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág. 143
[31] Curiosamente os lígures foram um dos
povos que ocuparam o território do sul de Portugal, Alentejo / Algarve
no séc.
V a.C., cf. MELO. Amílcar – Portugal
económico, político e social. Lisboa: Ed. Vieira da Silva, 2016.
Págs.26-
27
[32] PENNESE, Giuseppe – Pietro Martire d’Anghiera e le sue relazioni
sulle scoperte oceaniche, in Raccolta
di
Documenti e Studi – Publicati dalla R. Comissione
Colombiana – pel Quarto Centenario dalla Scoperta
dall’America, Parte V, Vol. II, Roma: MDCCCXCVI. Pág.20
[33] Tradução do texto a partir da versão
inglesa in BOURNE, Edward Gaylord – Spain
in America. Ed. James
Ward,
2003
[34] BERCHET, Guglielmo – Op. cit.. Pág. 194
[35] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág. 166.
[36] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág. 169.
[37] Idem, Pág. 195
[38] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág. 148.
[39] Trata-se de um grupo de avisos com
datas entre 23 Junho e 9 Julho. Não é, portanto, a data em que foi
remetido de Milão
[40] COLON, Hernando - Historie, capitulo V, La venuta dell'Ammiraglio in Ispagna, e come
si manifestò in
Portogallo, da che ebbe
causa lo scoprimento dell'Indie che egli fece. Veneza: Editora. Francesco de
Franceschi Sanese. 1571
[41] COLÓN, Cristóbal - Diario de a bordo. Edición de Luis
Arranz. Madrid: Editorial EDAF, 2006.
[42] COLÓN, Cristóbal - Diario de a bordo. Edición de Luis
Arranz. Madrid: Editorial EDAF, 2006.
[43] SENAREGA, Bartolomeo - Genuensis de rebus genuensibus
commentaria ab anno MCDLXXXVIII usque ad
annum MDXIV, in MURATORI, Ludovico – Rerum
Italicarum Scriptores, Tomo XXIV. Milão: Ex Tipographia
Societatis
Palatinae in Regia Curia. Pág 534-537
[44] Tradução livre, pelo Autor, baseada
na versão castelhana, in SANFUENTES Y CORREA, Henrique –
Cristóbal Colón y su detractor El
Marqués de Dos Fuentes.
Santiago de Chile: Imprenta Universitaria, 1918.
[45] BERCHET, Guglielmo – Op. cit. Pág. 201.
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