'Prova' {25} - pág.
149:
A aterragem fortuita de Colombo em Portugal pareceu a
Bartolomé de las Casas ... um misteriosos desígnio: Dios nuestro Señor milagrosamente me
enbió acá por que yo serviese a Vuestra Alteza;
dixe milagrosamente porque fui aportar a Portugal, adonde el rey de allí
entendía en el descubrir más que otro; El le atajó la vista, oído y todos los
sentidos, que en catorce años no le pude hazer entender lo que yo dixe. {25}
ACC:
A frase que o autor escolheu como prova nº 25 do
Colombo Genovês não apresenta efectivamente nada que o comprove. Já todo o
contexto do capítulo em que se insere merece a maior atenção porque é bem representativo
das deturpações que permitiram gizar a história oficial (págs. 149-155):
“É sabido
que D. Hernando Colón, que Las Casas reproduz, narra em pormenor as
circunstâncias inesperadas em que Colombo chegou a Portugal a nado, salvando-se
da batalha naval do Cabo de S. Vicente. …
Seja como
for, é óbvio que D. Hernando, e sobre as suas pegadas Las Casas, misturam duas
coisas: por um lado a batalha de 13.VIII.1476 em que os navios franceses que
tinham ido em socorro de Ceuta, sitiada pelos mouros, comandados por Guillaume
Casenove ou Coulon le Vieux, travaram batalha com cinco vasos de
comércio genoveses; por outro lado a batalha de 21.VIII.1485 em que uma frota
francesa de sete navios, comandada por Jorge Paleólogo Bissipat, por
alcunha Coulon le Jeune (ou Colombo o Moço) …
atacou nas mesmas paragens algarvias uma urca flamenga e quatro galés
venezianas. É evidente que não foi nesta segunda batalha, que se travou quando
Cristóvão Colombo passara já sete anos em Portugal e estava aparentemente já de
partida para Castela, que ele se salvou a nado, mas da primeira. Sabe-se aliás
que foi em 1485 e não em 1476 que veio a Portugal o primeiro embaixador
veneziano de que há notícia, Jerónimo Donato, a que H. Colón e Las Casas
erroneamente aludem neste passo, colocando portanto a sua vinda em 1476. A mera
análise interna da Vida do Almirante torna evidente um anacronismo de que D.
Hernando se não parece ter apercebido: depois de no capítulo V, datar o
combate de vicino al tempo nel quale Massimiliano, figliolo di Federico
terzo imperatore fu eletto re dei Romani (o que teve lugar a
16.II.1486 e é portanto grosso modo contemporâneo da segunda batalha) afirma no
capítulo XII que seu pai nel fine dell’anno 1483, col suo figliolino
don Diego, si partí segretamente di Portogallo; teria, por conseguinte,
deixado Portugal antes de aí ter chegado.”
Insistindo na opinião oficial de que D. Hernando
misturou e confundiu duas batalhas navais, o Prof. Thomaz vai mais longe e
afirma:
“Colombo vinha certamente a bordo da armada que
o governo de Génova decidira organizar a 24 de Maio de 1476 (….) Sobre a
batalha naval que se seguiu … nada achei que contradiga o testemunho de D.
Hernando e de Bartolomeu de las Casas sobre o salvamento de Colombo a nado, nem
qualquer nova razão para o pôr em dúvida, embora contenham o erro histórico que
acabo de referir.(…) Nem um único dos quinze relatos da batalha naval de
13.VIII.1476 que compulsei alude de perto ou de longe nem à presença de Jorge
Bissipat nem à de Cristóvão Colombo a bordo da armada francesa. (…) Aliás,
imaginando que a batalha (de 1485) se travou entre franceses e venezianos, não
podia logicamente dar o seu progenitor como embarcado num vaso genovês, já que
na sua história não há genoveses em cena. (…) É certamente a bordo desta frota
(genovesa), que como vimos incluía três vasos que haviam integrado a expedição
a Xío em que participou Colombo, que este navegava. É impossível discernir se é
propositadamente, para insistir no parentesco e amizade entre seu pai e Jorge
Bissipat, se por mero equívoco, que D. Hernando o diz embarcado ao lado deste
na armada corsária francesa … Com efeito, nem é provável que Jorge Bissipat
tenha tomado parte na aventura de 1476, nem podia Cristóvão Colombo,
recém-chegado de Xío, ter tido tempo para com ele ter entretanto “navegado
longamente”; nem o próprio Bissipat deve ter começado a navegar muito antes
dessa data, pois vimos já que é em 1475 que, pela primeira vez, é designado em
documentos oficiais por capitaine de la nef du Roy.”
Veja-se, sinteticamente, o que disse D. Hernando sobre
o episódio:
“Ma, tornando al principal proposito, dico che mentre
in compagnia del detto Colombo giovane l'Ammiraglio navigava, il che fece
lungamente, avvenne che intendendo che le dette quattro galee grosse veneziane
tornavano di Fiandra, andarono a cercarle e le trovarono tra Lisbona e il capo
di San Vincenzo, che è in Portogallo, dove venuti alle mani combattettero
fieramente…”
Ou seja, que o Almirante já navegava há bastante tempo
com o corsário Colombo-o-Jovem e que atacaram quatro galeras venezianas que
regressavam da Flandres, perto de Cabo S. Vicente e que:
“ … che vicino al tempo nel quale Massimiliano,
figliuolo di Federico terzo imperatore, fu eletto re dei Romani, fu mandato da
Venezia in Portogallo ambasciatore Hieronimo Donato, acciò che in nome pubblico
di quella Signoria rendesse grazie al re don Giovanni Secondo, perciocché tutta
la ciurma e uomini di dette galee grosse, che tornavano di Fiandra, egli aveva
vestiti e sovvenuti, dandogli aiuto con che potessero tornare a Venezia, dato
che essi presso a Lisbona erano stati superati dal Colombo giovane, corsale
famoso, che li aveva spogliati e messi in terra.”
Cerca da altura em que Maximiliano, filho do Imperador
Frederico III foi escolhido para Rei dos Romanos, foi enviado de Veneza a
Portugal o embaixador Jerónimo Donato para agradecer ao Rei D. João II por este
ter ajudado para que pudessem regressar a Veneza todos os que vinham nessas
galeras porque tinham sido atacados e despojados pelo corsário Colombo-o-Jovem.
Ou seja, o Almirante, e Colombo-o-Jovem atacaram
quatro galeras venezianas na batalha naval de 1485, pois para essa data apontam
a vinda do embaixador de Veneza e o facto do Rei ser já D. João II.
E qual a artimanha do Prof. Thomaz?
"Não pode ter sido 1485 porque nessa data já o
Almirante cá estava há vários anos e que partira para Castela em 1483."
"Que D. Hernando se enganou na batalha, e que portanto
foi em 1476 e não em 1485 que o Almirante esteve envolvido."
"Como foi em 1476 não foi o corsário Colombo-o-Jovem
mas sim Colombo-o-Velho."
"Como não foi Colombo-o-Jovem, então o Almirante não
acompanhava Colombo-o-Jovem."
"Como não acompanhava Colombo-o-Jovem nem acompanharia
Colombo-o-Velho (porque D. Hernando não diz isso), então o Almirante não era
corsário e vinha na frota genovesa."
"Só podia vir mesmo na frota genovesa porque tinha
estado com a mesma no ano anterior em Xío" (o que, não passa de uma afirmação do
autor, sem suporte)
Diz ainda o Prof. Thomaz:
“Nem um único dos quinze relatos da batalha naval de
13.VIII.1476 que compulsei alude de perto ou de longe nem à presença de Jorge
Bissipat nem à de Cristóvão Colombo a bordo da armada francesa.”
O que é óbvio, pois D. Hernando relata a participação
do pai na batalha de 1485. Se o Prof. Thomaz tivesse então compulsado
documentos sobre este ataque corsário de 1485 teria encontrado o seguinte, que
demonstra não só a participação de Jorge Bissipat nesse ataque, como também o
envolvimento de um familiar:
Venezia, 20
agosto 1485.
[DOMENICO
MALIPIERO, Annali veneti nell'Archivio storico italiano, vol,
VII, par. II, pp.
621-22]
A .20.
d'avosto, de notte, Colombo corsaro, el zovene,
fio de Colombo corsaro, capetanio de sette nave francese
armade, s' ha scontrá sora cao San Vincenzo, ne i mari di Spagna, in le quattro
galeazze de Fiandra…
Venezia, 21
agosto 1485.
[Bibliot.
Marciana, V I I it. cccxxi, Cronaca Savina, c. 212]
Se havé
anche in Venetia un altro notabil danno; erano uscide .4. galie per condur
mercantie d' Inghilterra, delle qual era capitano Bortolamio Minio, le qual
essendo carghe, et passando dal cavo di San Vicenzo, furono assaltate da un
famoso corsaro chiamado Colombo el zovene con .7. nave
ben armade,
1485.
[M. ANTONII
COCCEI SABELLICI Rerum venetarum, decad. IV, lib.111]
Ad hec
negocia de more exierant triremes quatuor: earum imperium penes Bartholomeum
[Minium fuit. sed cum he Ibericum navigarent oceanum, Columbus iunior,
Columbi pirate illustris, ut aiunt, nepos, cum septem navibus ad pugnam
instructis, circa Sacrum promontorium, hodie Vincentii caput appellant, sub
noctem factus est Véneto obvius.
Venezia, 17
settembre 1485.
[Bibliot.
Marciana in Venezia, VII it. cccxxm, Crónica de Venetia traduta de verbo ad
verbum.]
Del .1485.
adi .17. settembrio vene nove a Venetia come era stade prese le galie del viazo
de Fiandra de 1' andar in lá apreso .4. iornade a Fiandra da uno nevodo
de Colombo e uno Zorzi Griego i qual era com .6. barche grose, i qual
le haveva tegnude a mente e tristamente le prese, le qual iera mal armade de
boni homeni, ch' el non iera pur homo che savese dar fuoco a una bombarda, fo
de gram daño a Venitiani;
O relato feito por D. Hernando terá algumas
imprecisões, mas é tão detalhado e minucioso que não se pode colocar em dúvida
que quis referir-se à batalha naval de 1485.
O Prof. Thomaz, tal como muitos outros autores, exclui
a possibilidade de se tratar da batalha naval de 1485 por considerar que nessa
data já o Almirante teria partido para Castela depois de ter vivido em Portugal
vários anos.
Ora este acontecimento que D. Hernando presumiu
corresponder ao surgimento do Almirante em Portugal, pode ter sido apenas uma
atribulada chegada, mas não a primeira.
E a ida do Almirante para Castela em 1484 (o Prof.
Thomaz indica 1483 mas isso deve-se a erro na versão da Historia del Almirante que terá consultado) não corresponde a uma
partida definitiva. Com efeito, D. Hernando menciona 1484, várias testemunhas
nos Pleitos Colombinos referem que o viram chegar com o filho em 1484, mas o
Almirante, numa das suas apostilhas, indica que estava em Portugal em 1485, em
data que se pode situar posterior a 11 de Março:
. . . quod .
. . rex Portugalie misit in Guinea anno Domini .1485. magister
Ihosepius, fixicus eius & astrologus, [ad com]piendum altitudinem solis in
totta Guinea; qui omnia adinplevit, & renunciavit dito serenissimo
regi, me presente, quod . . . alliis in die .xi. marcii invenit
se distare ab equinoxiali gradus .v. minute in insula vocata " de los
Ydolos," que est prope [sierrja Lioa. & hoc cum maxima diligencia
procuravit. postea vero sepe ditus serenissimus rex misit in Guinea in alliis
locis. postea . . . & semper invenit concordan com ipso magistro Iosepio,
quare sertum habeo esse castrum Mine sub linea equinoxiali.
(Raccolta Colombiana, Parte I, Vol. II,
postile alla Historia de Pio II, nº 860).
Pode assim, face à conjugação de documentos,
admitir-se que o Almirante se deslocou a Castela com o filho em 1484, para o
deixar com sua cunhada Briolanja Moniz, provavelmente porque Filipa Moniz tinha
falecido, e regressou para Portugal, continuando a navegar com Colombo-o-Jovem
até ao naufrágio do ataque naval de Agosto 1485, tendo posteriormente partido
definitivamente para Castela.
Na frase, importante também são os 14 anos que o põem a viver em Portugal, segundo as suas próprias palavras, pelo menos desde cerca de 1471 e não a chegar em 1476, o que obviamente o Prof. Thomaz não analisa pois tem um método científico particular…