sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

Colombo genovês, o tio errado - # 28 ('Prova' 46)

 {46} - pág. 252:

Tem-se a impressão de que a metonomásia do descobridor em potência não terá tido lugar imediatamente, no momento da mudança para Castela, mas a pouco e pouco. De facto, nos raros documentos castelhanos anteriores às Capitulaciones de Santa Fé, de Abril de 1492, que nos chegaram ocorre sempre a forma intermédia Colomo;

 

ACC:

A designação Colomo terá ocorrido nalguns poucos documentos castelhanos, nomeadamente em relações de pagamentos e na carta do Duque de Medinaceli.

Mas o mais relevante no desenvolvido texto do Prof. Thomaz sobre estas relações de pagamentos, é que transcreve o primeiro do total de quatro, datado de 5 Maio 1487, dizendo que os outros são idênticos pelo que basta citar um. (pág. 252)

Com essa habilidade, o Prof. Thomaz monta um expediente que lhe permite seguidamente negar que Colon tenha sido chamado de “portugués” num desses registos.

Na verdade, esses quatro registos de pagamento são muito semelhantes, mas aquele que está datado de 27 Agosto 1487 tem a particularidade de especificar que os quatro mil maravedies lhe são entregues para “ir al Real”. O Real era o acampamento régio, corte itinerante, que se encontrava nessa altura em Málaga, como Navarrete indica na publicação do documento.

Só na pág. 254 é que o Prof. Thomaz refere que o pagamento de 27 de Agosto é dos mais significativos, pois é feito para que Colombo (sic) se desloque ao Real de Málaga. Na verdade, o nome que constaria no documento é Colomo.

Segue-se no livro mais um desenvolvido texto sobre as moedas em curso e o seu valor equivalente em ouro e só na página 256 é que o Prof. Thomaz argumenta que o facto de haver um pagamento a um português anónimo (datado de 18 Outubro 1487) é uma pescadinha de rabo-na-boca dizendo, talvez sarcasticamente, que

“prova-se que Colombo era considerado português porque há um pagamento a um anónimo que é qualificado de português; e prova-se que o português anónimo era Colombo … porque o anónimo é qualificado de português”

Para que o sarcasmo do Prof. Thomaz não deslustre o seu prestígio, transcrevemos os dois registos em causa:

1487-08-27 – “En 27 de dicho mes di a Cristóbal Colomo cuatro mil maravedís para ir al Real [de Málaga] por mandado de Sus Altezas; por cédula del obispo. Son siete mil maravedís, con tres mil que se le mandaron, para ayuda de su costa, por otra partida de 3 de julio.”

1487-10-18 – “Dj mas a [espaço em branco], portugues, este dia treynta doblas castellanas, que Su Altesa le mando dar presente el dotor de Talauera; dioselas por mj Alonso de Qujntanjlla; este es el portogues que estaua en el Real; esto fue a la partida de Linares, et su altesa me lo mando en persona …”

Faltou ao Prof. Thomaz olhar seriamente para os dois registos, em lugar de tentar ocultar a relação entre eles. Cristóbal Colomo recebeu quatro mil maravedis no dia 27 Agosto expressamente para ir ao Real de Málaga e o português que recebeu as trinta dobras em 18 Outubro era aquele que tinha estado no Real de Málaga.

Como o Prof. Thomaz fez questão de registar o valor das moedas e cada dobra castelhana valia 480 maravedis, então o pagamento de 18 de Outubro foi equivalente a 14400 maravedis, valor bastante superior ao dos outros pagamentos feitos ao designado Colomo. Tal soma poderia ser paga a um qualquer anónimo, fosse ele português ou de outra nacionalidade?

O facto de o nome ter sido ou deixado por preencher ou raspado, apenas permite admitir que o pagador ou não sabia o nome se ficou o espaço, ou que se pretendeu ocultar o nome daquele português que tinha estado no Real, se foi raspado depois de escrito. Note-se que este português não acompanhava a Corte, senão não teria sido designado da forma que foi, mas esteve em Málaga. Colon também não acompanhava a Corte, mas recebeu um pagamento expressamente para se deslocar a Málaga.

Compraz-se ainda o Prof. Thomaz a refutar que ‘el dotor Talavera’ fosse Frei Hernando de Talavera, Presidente da Junta de Letrados, mas sim que era o Dr. Rodrigo Maldonado de Talavera, membro do Conselho Régio, rebatendo assim a possível associação daquele pagamento à apresentação do projecto de Colon à Junta de Letrados, acrescentando:

“ainda que, por hipótese, tivesse sido feito a mando de Frei Hernando de Talavera, bastaria isso para provar que o pagamento foi feito a Colombo?”

“Teriam então os Reis deputado um homem da craveira do primeiro arcebispo de Granada devolvida à cristandade apenas para apajear um estrangeiro desconhecido, pobre e mal vestido, que por ali aparecera com a idéia peregrina de alcançar as Índias pelas traseiras do Globo?”

Na verdade não foi à Junta de Letrados, presidida por Frei Hernando de Talavera, então recentemente nomeado Bispo de Ávila, pois só foi nomeado Arcebispo de Granada em 1493, que Cristóvão Colon, e não um qualquer estrangeiro desconhecido pobre e mal vestido, esse sim o tal Colombo genovês a quem o Prof. Thomaz chama tio, apresentou por mais do que uma vez, o seu projecto?

Acrescenta o Prof. Thomaz (pág. 253) que esta forma Colomo resulta provavelmente do apelido ter sido interpretado como sendo a forma masculina do nome castelhano de Santa Coloma e que embora a forma colomo não esteja atestada em castelhano nem como substantivo nem como antropónimo, em catalão existe o termo colom, que, como seria de esperar, significa “pombo”, e que, à semelhança do italiano colombo ou do português pombo, facilmente se pode tornar apelido.

A esta questão onomástica nos referiremos oportunamente, quando se abordar a carta de Colon a Santángel quando chegou a Lisboa.

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